30/08/2013
Por: Samuel Bryan e Jaqueline Teles
O Complexo de Piscicultura marca uma nova era no setor acreano, mas os investimentos começaram nos anos 80 (Foto: Gleilson Miranda/Secom)
Com a recente entrega da primeira etapa do Complexo de Piscicultura do Acre, numa cerimônia que contou com milhares de produtores rurais, o governador Tião Viana e o ex-presidente Lula, começa um novo tempo na piscicultura estadual, que deverá revolucionar a produção rural do Acre e elevar a qualidade de vida de pequenos produtores, num projeto ousado que atende todos os campos do setor. Mas a história da piscicultura acreana é maior. Com investimentos oficiais desde o fim dos anos 70, esse é um caminho longo, com momentos únicos e personagens próprios.
A história da piscicultura acreana começa em 1979, com a inauguração da Estação de Piscicultura do Acre, no governo de Geraldo Mesquita, mas foi mesmo inaugurada em setembro. Sua produção de alevinos só começou em dezembro, e a um ritmo muito fraco. Em seu primeiro ano, o centro só foi capaz de produzir dois mil alevinos, um número irrisório. Foi então que um pernambucano chegou ao Acre para mudar esse quadro, o engenheiro de pesca Júlio Resende.
Ninguém acreditava que aquilo poderia dar certo, mas quem apostou ganhou
Wildy Viana
Assumindo a estação em fevereiro de 1980, Resende conseguiu fazer a produção saltar. Em 1981, com a aquisição de espécies exóticas de peixes no Acre, a produção anual de alevinos saltou para 30 mil, e a partir de 1985 foram dois milhões por ano. “Em 1980 deveria haver apenas mil açudes no Acre, todos sem peixe, e cerca de 50 produtores. Hoje existem uns cinco mil açudes e a produção anual é de seis mil toneladas”, explica Resende, que brinca: “Peixe é um lucro garantido na vida do produtor rural. Quem decide que não vai dar lucro ou é Deus ou são os ladrões de peixe”.
Foi Júlio Resende quem ajudou a trazer o peixe que seria um dos maiores sucessos na piscicultura acreana: o tambaqui. E foi Wildy Viana, ainda quando era deputado federal, quem autorizou a importação dos tambaquis e lutou por novos investimentos. Esses primeiros alevinos foram trazidos de São Paulo e se adaptaram tão bem aos tanques acreanos que começaram a desovar em dois anos e meio, em vez de três anos, o tempo padrão.
A Estação de Piscicultura do Acre produziu no seu primeiro ano apenas 2 mil alevinos (foto: acervo pessoal)
A história viva
Falar sobre reprodução de alevinos no Acre é lembrar-se de Wildy Viana, hoje com 84 anos. Foi ele que, ainda na década de 80, trouxe do interior de São Paulo oito mil alevinos de tambaqui. “Naquela época me chamavam de louco, me criticavam. Como eu estava trazendo peixe da Amazônia para a Amazônia?, questionavam. Eles não entendiam que era impossível capturar alevinos de tambaqui nos rios do Acre, ou até mesmo capturar matrizes para reproduzir aqui”, relembra.
Tu tem que ser honesto e trabalhador. Esse é o único segredo do sucesso
Ivan de Souza
Foi abusando da ousadia que Wildy Viana conseguiu com a Aeronáutica, em Brasília, um avião Bandeirante para trazer os oito mil alevinos, que foram criados na Estação de Piscicultura do Acre. As larvas cresceram, e meses depois alguns daqueles alevinos se transformaram em matrizes. Wildy ainda guarda diversos álbuns de fotografias nos quais mostra a reprodução dos alevinos, uma atividade totalmente artesanal. “A única coisa moderna que tinha naquela época era uma injeção que se aplicava nas matrizes para estimular a saída da ova [óvulos] e o sêmen”, afirma.
Geraldo Bernadino (centro) ao lado de Wildy Viana e outros técnicos da Estação (foto: acervo pessoal)
Nas fotos se observa que o trabalho era mesmo manual. Os técnicos usavam vasilhas como panelas e tachos para fazer a fecundação dos óvulos. Mas, como tudo que é pioneiro enfrenta mais dificuldade, ele comenta que naquela época as pessoas eram muito descrentes. “Ninguém acreditava que aquilo poderia dar certo, mas quem apostou, ganhou. O ‘Japonês’, lá do Bujari, foi um que acreditou e está aí para contar a história”, conta Wildy.
Salto na produção
Geraldo Bernadino também foi um dos responsáveis técnicos por engrenar a produção no Estado junto com Júlio Resende. Trabalhando hoje com piscicultura para o governo do Amazonas, ele diz que: “Estive aqui há 30 anos. Estou muito feliz por essa homenagem. Quando estive aqui vim para o trabalho de reprodução de alevinos de tambaqui com o Júlio. Agora, esse é um novo momento, em que o produtor passa a ser protagonista da história”.
A piscicultura é uma das atividades que mais cresce em termos percentuais no Acre. Hoje são produzidos cerca de 10 milhões de alevinos por ano em todo o Estado, vindos de dez produtores. E Júlio Resende ainda faz parte desse número mesmo aposentado. Em 1995 ele fundou, com o irmão, a Piscicultura Nordeste, que vende alevinos para todo o Acre, conseguindo produzir o ano inteiro.
O Tião Viana foi muito inteligente de atuar em todos os elos da cadeia, desde os alevinos, até a filetagem
Júlio Resende