A indústria de rações: situação atual e perspectivas

Por: Vanice Waldige Coordenadora do AnfalAqua
Agribrands do Brasil – Purina
[email protected]
Alexsandra Caseiro Vice-coordenadora do
AnfalAqua Nutron Alimentos
[email protected]


Panorama mundial da produção de rações:

Por mais de duas décadas, a aquicultura tem se apresentado como uma das atividades do ramo de produção animal que mais cresce no mundo, chegando a apresentar um crescimento superior a 10% ao ano. A maior produção está concentrada na região asiática, representando 90,8% da produção global (35,81 milhões de toneladas em 1998) – FAO (2000). Historicamente, o limite de pesca extrativa nos oceanos está muito próximo de ser atingido, uma vez que o crescimento mundial não supera 1,6% ao ano. Isto significa, que a maior parte do incremento observado na produção de organismos aquáticos vem da produção comercial, que necessita do suprimento de nutrientes através dos alimentos suplementares e/ou rações balanceadas.

Em 1998, a produção mundial de rações para organismos aquáticos (“aqua”) foi estimada em 12,3 milhões de toneladas (5% da produção mundial de rações – figura 1). Esta soma de rações foi destinada ao cultivo comercial carpas (49%), salmões (14,5%), camarões marinhos (14,1%), peixes marinhos (7,1%), tilápia (5,8%), catfish (5,1%), enguia (2,2%) e “milkfish” (2,2%) – Tacon (2000). Já em 1999, o total de ração produzida mundialmente para alimentação de organismos aquáticos foi de 16 milhões de toneladas, representando um crescimento de 33% em um ano. Dados apresentados pela FAO (2000) sugerem um volume global de rações “aqua” de 20 e 25 milhões toneladas para os anos de 2005 e 2010, respectivamente.

Embora estes dados pareçam ser muito expressivos, vale ressaltar que a indústria de rações “aqua” é relativamente jovem. Por este motivo, o conhecimento dos requerimentos nutricionais da maior parte das espécies é bastante limitado comparado com aves e outros animais domésticos. Vale informar que os primeiros esforços para a produção de alimentos para a produção comercial de frangos datam da década de 20.

De acordo com Schimittou (1995), ao redor do mundo, estruturas mais modernas para a produção de organismos aquáticos datam de 1960, período que coincide com o uso de rações peletizadas para peixes. Entretanto, este cenário se fez sentir em apenas alguns países. Até mesmo a aquicultura da China, maior produtor mundial de organismos aquáticos do mundo, teve o seu grande impulso a partir de 1989, quando teve início a produção de rações peletizadas. Em 1995, a produção mundial de organismos aquáticos apresentou um crescimento revolucionário, devido aos avanços em conhecimento de nutrição e na tecnologia de produção de rações.

FIGURA 1. Produção mundial de ração em 1998 por setor - total = 575 milhões de toneladas (Fonte Hofman, 2000).
FIGURA 1. Produção mundial de ração em 1998 por setor – total = 575 milhões de toneladas (Fonte Hofman, 2000).

A indústria de ração e o desenvolvimento da aquicultura brasileira:

Os primeiros esforços de estabelecer a piscicultura como uma atividade econômica datam da década de 40, com a introdução de espécies como carpa comum e truta arco-íris nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro. Entretanto, o grande despertar da atividade foi observado no início dos anos 80, com o desenvolvimento da tecnologia para a desova induzida do tambaqui e do pacu, e ainda com a introdução de tecnologia para a produção de um número significativo de espécies exóticas – tilápia, carpa comum, bagre americano e bagre africano (Castagnolli, 1995).

Neste momento, os peixes eram alimentados com resíduos ou com mistura de ingredientes, ou ainda com rações comerciais recomendadas para a nutrição de outros animais. No Brasil, a produção de peixes produzidos com rações comerciais específicas tem história curta, começando em 1987 com produtos peletizados e após 5 anos com produtos extrusados (Lovshin, 1997).

A introdução da tecnologia de produtos extrusados para a piscicultura representou uma maior facilidade no manejo dos peixes e ainda marcou uma notória evolução nos níveis de produção. Níveis de produtividade de peixes que não ultrapassavam os 3.000 kg/ha para a produção com resíduos em conjunto com rações suplementar, passaram a ser de 4.000 até 40.000 kg/ha com o uso de extrusada balanceada em viveiros, em função da espécie cultivada e do nível de tecnologia de produção empregado.

Inicialmente, o produtor dispunha de um ou dois tipos de rações para conduzir todo o cultivo, sendo que em muitas situação possuía apenas um tamanho de ração para alimentar os mesmos.

Após alguns anos, com a difusão de novas tecnologias para a produção de peixes em tanques-rede ou gaiolas e demais sistemas super-intensivos, surgiu a necessidade da indústria disponibilizar no mercado rações específicas para cada fase de cultivo, no que diz respeito ao tamanho de peletes e densidade nutricional.

Para a área de camarões, a história não foi muito diferente. Ocorreram marcos como a demonstração da viabilidade comercial da espécie Litopenaeus vannamei para sua produção no Brasil em 1995/1996 e o desenvolvimento de uma ração espécie-específica.

Certamente, o desenvolvimento da atividade não está apenas ligado a este fator, mas também ao desenvolvimento constante de novas tecnologias de cultivo. Uma coisa é certa, a evolução da nutrição e tecnologia de produção de rações, juntamente com a evolução na tecnologia de manejo alimentar, permitiram produtores de camarões saltarem dos níveis de produção de 900 kg/ha/ano em 1996 para a média de 5.500 kg/ha/ano observada em 2002, o que dá ao Brasil a posição de liderança mundial em produtividade.

Panorama atual da indústria de rações:

Estimativa dos volume de rações:

Em 2002, a indústria de alimentação animal como um todo, obteve uma expressiva representação econômica, com faturamento global acima de US$ 7 bilhões. O setor faz previsões otimistas para 2003, estimando um mercado aquecido por três fatores: aumento de consumo humano de proteína animal e seus derivados, fortalecimento da produção animal através do aumento dos rebanhos; e demanda crescente internacional pela carne brasileira (bovinos, suínos, aves, peixes e camarões). No último ano, a produção brasileira de rações balanceadas cresceu 7,17%, saltando de 38,8 milhões de toneladas para cerca de 41,6 milhões de toneladas. Para 2003 a previsão é de crescimento um pouco menor, em torno de 5,5%.

O segmento de rações para Aqüicultura (peixes e camarões) fechou em 2002 com 202.300 toneladas e a previsão para 2003 é de 247.500 toneladas, um crescimento estimado em 22%. Este está muito acima do que é esperado para a avicultura (5,3%), suinocultura (5%), bovinocultura (7,1%) e pequenos animais (5,3%).

Dentro da produção nacional de rações, o segmento de aqüicultura representou 0,49% do volume em 2002 (FIGURA 2) e será responsável por 0,56% do volume em 2003 (FIGURA 3). Os números apontam que o segmento é relativamente pequeno dentro da produção nacional de rações, contudo as indústrias, principalmente as pertencentes ao ANFAL AQUA, estão direcionando esforços porque acreditam no enorme potencial que o Brasil dispõe para a aqüicultura.

FIGURA 2. Vendas de rações por segmento para o ano de 2002.
FIGURA 2. Vendas de rações por segmento para o ano de 2002.

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FIGURA 3. Expectativa de participação em vendas de rações por segmento para o ano de 2003.

A TABELA 1 apresenta a participação dos volumes por segmento dentro do setor de Aquicultura. O volume de rações para peixes tropicais em 2002 cresceu 6,4% e espera-se um salto de 11% para 2003. As rações para peixes carnívoros cresceram 18,7% em 2002 e estima-se 26,4% o crescimento para 2003. O segmento que representa o maior crescimento dentro da aqüicultura, são as rações para camarões marinhos, que em 2002 cresceu 24,8% e para 2003 espera-se um crescimento de 22,3%.

Estes grandes saltos nos volumes de rações para camarões marinhos foram ocasionados principalmente pelo incremento no número de fazendas, pelo aumento do número de viveiros em produção, pelo aumento da produção e de produtividade, adicionalmente no aumento de laboratórios e produção de pós-larvas, dos centros de processamento e no grande salto nos volumes de camarões exportados.

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A situação dos ingredientes:

O ano de 2002 foi um ano marcado por fortes reajustes nos preços de rações tanto para a área de aquicultura, como para as demais as áreas do ramo de produção animal. Esta situação pode ser explicada pela acentuada elevação nos preços das principais matérias-primas empregadas na formulação das mesmas (farelo de soja, milho e farelo de trigo). Estas matérias-primas são tidas como “commodities” e a sua variação de preço é função da variação cambial e de um posicionamento dos estoques mundiais. Além destas matérias-primas, temos ainda a farinha de peixe, ingrediente amplamente utilizado na formulação de rações de peixes e camarões cultivados em sistemas intensivos ou super-intensivos.

Os aumentos registrados em 2002 apontam um incremento de aproximadamente 45%, 115%, 100% e 73% para o farelo de soja, milho, farelo de trigo e farinha de peixe, respectivamente. Dentre os setores de produção animal trabalhados pelo Brasil, o que mais sentiu o impacto dos reajustes de matérias-primas foi a suinocultura, seguido pela avicultura. A suinocultura vem amargando os efeitos de uma crise que já completou um ano.

Em outubro de 2002, produzir uma arroba de suíno custava R$ 34,00, mas o produtor somente conseguia vender por R$ 30,00. Em abril de 2003, os prejuízos apresentados pela atividade são menores, e somente agora os primeiros sinais de reação se fazem sentir. Para minimizar o impacto deste problema, suinocultores têm trabalhado com peso de abate abaixo da média.

Ao contrário da aquicultura, a suinocultura e a avicultura industrial se caracterizam pelo uso de rações produzidas nas granjas. Diferente do que muitos imaginam, o impacto da crise não está associado ao uso de rações comerciais, e sim a atual conjuntura do mercado de ingredientes para rações.

Soja e subprodutos:

Embora o Brasil seja auto-suficiente na produção de soja, as cotações desta matéria-prima são regidas com base em índices da bolsa de Chicago. A soja é cotada em dólar, o que faz com que os preços desta matéria-prima em reais sejam vulneráveis à desvalorização cambial. Dados da da desvalorização cambial e da variação nos preços desta matéria-prima são apresentados nas FIGURAS 3 E 4.

No último ano agrícola nos Estados Unidos, safra 2001/2002, uma quebra de safra da soja plantada foi registrada em função da seca. Considerando que este país é o maior produtor mundial desta matéria-prima, esta situação aqueceu o mercado internacional, devido à redução nos estoques mundiais da mesma.

Para a safra americana em curso (setembro/02 a agosto/03), o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos anunciou uma redução nos estoques finais de soja em grão em 9,4%. Essas reduções são substanciais frente a crescente demanda global deste “commodity”. Avanços dos preços internacionais da soja já foram registrados nos pregões de Chicago e da BM&F – Bolsas de Mercadorias e Futuros (Bueno, 2003).

Diante da tendência de redução nos estoques mundiais, a tão esperada retração no preço da soja e dos seus subprodutos para os valores praticados anteriormente, parece algo bastante distante da realidade do mercado. De acordo com Muraro Jr. (2003), a expectativa para 2003 é que a cotação da soja grão e subprodutos “em dólares” seja a melhor dos últimos 4 anos. A BM&F já têm contratos firmados para vencimento em julho/03 a US$ 13,02/saca e setembro/03 a US$ 12,96/saca. Em 17/04/03, a cotação da soja grão fechou US$ 12,20/saca, o que representa um aumento entre 6,2 e 6,7% em dólar para os próximos meses.

Enquanto este panorama preocupa o setor de produção animal, produtores de soja torcem para que ele se concretize. Se a cotação do dólar mantiver a tendência de queda como vem apresentando no último mês, é possível que o mercado brasileiro venha sentir alguma redução no preços da soja e subprodutos “em reais”.

FIGURA 4. Valores médios da cotação da moeda americana em relação ao real. Fonte: FNP Consultoria (2003).
FIGURA 4. Valores médios da cotação da moeda americana em relação ao real. Fonte: FNP Consultoria (2003).

FIGURA 5. Histórico de preços médios mensais de farelo de soja disponível em SP (Orlândia). Fonte: FNP Consultoria (2003).
FIGURA 5. Histórico de preços médios mensais de farelo de soja disponível em SP (Orlândia). Fonte: FNP Consultoria (2003).

Milho:

Além do dólar alto, a quebra de safra em algumas regiões do Brasil gerou um problema de abastecimento do mercado em 2002. Este fator, aliado a uma forte demanda, principalmente no segundo semestre, fez com que o preço do milho para as indústrias de ração subisse mais de 100% desde julho (Osse, 2002). Dados da variação dos preço do milho para o período de 2000 a 2003 são apresentados na FIGURA 6.

As tendências do mercado de milho foram discutidas no seminário “Perspectivas para o Agribusiness 2003/2004”, realizado em 9 de abril, em São Paulo. A possibilidade de diminuição de exportações norte-americanas de milho, geradas pelo desvio dos excedentes exportáveis aos programas de produção de álcool etílico, poderá elevar o piso dos preços brasileiros pela paridade de exportação. A perpetuação da atratividade da soja em relação ao milho dá força ao incremento de safrinha (Caffagni e Santos, 2003).

Estatísticas de produção de milho para 2003 apontam possível solução da falta de milho no país. O grande crescimento projetado está para a produção de milho safrinha, apresentado um crescimento de 45% para a produção plantada fora de época (Solani, 2003)

Embora o probabilidade de ocorrer problemas com abastecimento de milho para a indústria de rações durante 2003 seja reduzida, a cotação desta matéria-prima tem forte tendência a se manter em patamares elevados devido a diminuição das exportações americanas. No dia 10 de abril, a BM&F negociou milho para o vencimento maio/03 a R$21,55/saca, o julho a R$22,60/saca, o setembro a R$24,33/saca e o novembro a R$25,56/saca (Caffagni e Santos, 2003).

FIGURA 6. Histórico de preços médios mensais de milho disponível em SP (Campinas). Fonte: FNP Consultoria (2003).

Farelo de trigo:

O cenário de abastecimento do trigo é um pouco diferente do que pode ser observado para soja e milho. O Brasil importa entre 65 e 70% de todo o trigo consumido anualmente, sendo que a Argentina é o principal fornecedor desta matéria-prima ao país.

Em 2002, o trigo ficou mais caro no mercado internacional devido a problemas de safra nos principais países exportadores do mundo, seja pela irregularidade climática e/ou pela redução na área plantada. Com isso, o volume produzido pela safra mundial apresentou uma redução de 2% em relação a safra anterior, paralelamente a um aumento na demanda desta matéria prima.

O resultado veio com aquecimento dos preços internacionais do produto e seus subprodutos nas principais bolsas de mercadorias do mundo, para atingir os mais altos preços desde 1996/1997 (Safras & Mercados, 2003). Ao mesmo tempo, a desvalorização do real, encareceu ainda mais a compra destas mercadorias pelos brasileiros. Devido a esta conjuntura, mesmo em período de safra, os preços de trigo e subprodutos se mantiveram em alta. Dados comportamento dos preços de farelo de trigo para os anos 2000, 2001 e 2002 são apresentados na Figura 7.

Durante o segundo semestre de 2002, os preços pagos aos produtores brasileiros atingiram os níveis mais elevados desde 1990, fator que se constitui na principal causa do incremento de 13% na área cultivada desta matéria-prima para 2003 (Silva e Ferreira, 2003). Em condições normais de clima, existe também a possibilidade de crescimento em produtividade, o que pode representar um aumento de 40% em relação a safra atual.

FIGURA 7: Preços históricos de farelo de trigo em São Paulo - período: 2000 a 2002. Fonte: 1. Moinho Pacífico (2002) - preços de 2002. 2. FNP Consultoria (2003).
FIGURA 7: Preços históricos de farelo de trigo em São Paulo – período: 2000 a 2002. Fonte: 1. Moinho Pacífico (2002) – preços de 2002. 2. FNP Consultoria (2003).

Caso este número se confirme, a expectativa é de um ano mais tranqüilo em termos de abastecimento, e também de preços em relação ao que foi observado no último ano (Safras & Mercados, 2003). Ainda assim, o mercado internacional será o grande balizador dos preços. internos, basicamente o mercado argentino.

Farinha de peixe:

No Brasil, as fábricas de rações vem trabalhando com dois tipos de farinha de peixe: (1) farinha branca que é importada do Chile ou Peru, com nível de proteína bruta entre 64 a 68%, e (2) farinha marrom que é produzida no Brasil e tem nível de proteína bruta entre 50 e 55%. A diferença entre estas duas farinhas é basicamente a qualidade da matéria-prima utilizada para a produção das mesmas, sendo que a primeira é feita de peixes inteiros e a segunda de resíduos do processamento de pescado.

As farinhas importadas são utilizadas para a formulação de rações com maior densidade nutricional, ou seja para peixes carnívoros e camarões – produzidos em altas estocagens, enquanto que as farinha nacionais são utilizadas em formulações de peixes onívoros e camarões – produzidos em baixas estocagens.

Em 2002, o abastecimento desta matérias-primas foi bastante complicado devido as variações de preços impostas pelo mercado e pela desvalorização cambial. As farinhas importadas mantiveram a sua cotação em dólar, mas as farinhas nacionais apresentaram incrementos de preços superiores a valorização desta moeda, saltando de R$ 585,00/tonelada em janeiro de 2002 para R$ 1.015,00/tonelada em dezembro do mesmo ano (FIGURA 8).

Esta situação pode ser explicada pelos problemas de abastecimento que são devido ao período de defeso da pesca de sardinha (dezembro a fevereiro) e a grande procura desta matéria-prima em detrimento da reduzida oferta de produto de qualidade no mercado nacional.

Para 2003, a expectativa de abastecimento do mercado com farinha de peixe importada tende a se complicar, uma vez que o governo do Peru anunciou o fim da pesca exploratória e o início de uma estação oficial de pesca controlada pelo governo. Esta medida deve diminuir a disponibilidade desta matéria-prima no mercado internacional e aumentar a cotação da mesma em dólar (Raternink, 2003). O cenário para a farinha de peixe nacional deve variar em função da lei da oferta e da procura.

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FIGURA 8. Variações nos preços da farinha de peixe nacional pagos em Campinas para o ano de 2002. Cotações em reais e em dólar. Fonte: ANFAL (2002).

Formação de preços das rações para organismos “aqua”:

A formação de preços de rações para organismos aquáticos engloba no mínimo 6 itens de custos, sendo eles: formulação (preços dos ingredientes), industrialização (custo operacional: mão de obra + encargos, energia elétrica, gás, manutenção e depreciação de equipamentos), controle de qualidade (mão de obra + encargos e custos de análises laboratoriais das matérias-primas e rações), custos administrativos, custos departamentos suporte (pesquisa e desenvolvimento, departamento técnico e equipe de vendas) e tributações (ICMS, PIS, COFINS, Imposto de Renda, IPTU e CPMF).

Dentre estes itens, apenas o custo de formulação sofre influência direta sobre a variação do custo médio de estoque das matérias-primas presentes na fábrica e da variação cambial, sendo que este pode representar de 55 a 65% do custo de uma ração. Esta variação vai ser função da densidade nutricional da ração.

O custo de industrialização vai ser o segundo fator de custo de maior importância na formação de custos das rações “aqua”, girando entre 10 e 15% do custo rações extrusadas e 5% para rações peletizadas. Os demais custos listados vão ser função da estrutura de cada fabricante.

Comparação com o mercado de frangos e suínos:

Em 2002, o Brasil ocupou a posição de segundo maior produtor mundial de frangos de corte e quarto de suínos. O país se mostrou muito competitivo nestes dois segmentos em mercados específicos como a Europa e Rússia. Porém, a desvalorização cambial em 2002 e a agressividade de venda do Brasil a preços mais baixos levaram forças locais a impor quotas de importação aos produtos brasileiros.

Para a área de suinocultura, setor que exporta 50% do seu volume para a Rússia, esta imposição se fez sentir em maior intensidade devido aos registros de excedente de produção, principalmente no sul do país. Este incremento na produção atingiu níveis de produção além do que as cotas de exportação conseguiram absorver. O excesso de oferta de produto no mercado fez com que o preço da carne suína não pudesse ser reajustado a ponto de cobrir o aumento nos custos de produção do setor.

Em contrapartida, o impacto destas imposições para a avicultura foi menor, uma vez que o setor diversificou a sua atuação no mercado internacional, chegando a trabalhar com exportação para 100 diferentes países.

Comparando o mercado de aquicultura com o de suinocultura e avicultura, podemos dizer que a atividade da piscicultura assemelha-se muito com a suinocultura, por diversificar pouco o seu mercado de atuação, o que torna a atividade muito vulnerável a dinâmica de oferta e demanda do mercado. Por outro lado, temos a atividade de camarão que se assemelha muito com a avicultura, com a busca constante de novas fronteiras comerciais no mercado interno e externo, o que reduz o risco da atividade frente a oscilações do mercado. Dados de preços de venda de suínos e frangos são apresentados na FIGURA 9.

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FIGURA 9. Médias mensais de preço de suíno e frango pago ao produtor no estado de São Paulo nos anos de 2001 e 2002. Fonte: Jox (2003).

Perspectivas e avanços tecnológicos nas rações “aqua”:

Alguns pontos são determinantes para o futuro da aqüicultura, como o aumento do uso de proteínas vegetais e a redução das perdas de nutrientes antes da ingestão. Para atender o primeiro ponto crítico, que refere-se ao uso de proteínas vegetais é necessário estudar o balanceamento de dietas com aminoácidos sintéticos e reduzir os fatores antinutricionais destes ingredientes com o uso de enzimas específicas. Para reduzir as perdas de nutrientes antes da ingestão, as indústrias se preparam para a utilização de atrativos que aumentam a palatabilidade das rações e estimulam o consumo, reduzindo assim as perdas que vão para o ambiente. Outra tecnologia que visa prevenir a perda de nutrientes das rações dissolvidos na água, será a encapsulação de nutrientes como aminoácidos, vitaminas, minerais e promotores de crescimento.

A indústria também poderá lançar outras tecnologias como o uso de imuno-estimulantes para aumentar a resistência a doenças, o uso de promotores de crescimento e de pigmentantes para atender mercados que necessitam desta característica.

A nutrição e estratégias de manejo alimentar são essenciais para o desenvolvimento sustentável da aqüicultura. O desenvolvimento dos alimentos do futuro serão focados no uso eficiente das matérias-primas disponíveis e na redução dos restos alimentares e perda de nutrientes não absorvidos pelos organismos aquáticos. Com o avanço do conhecimento dos requerimentos nutricionais das espécies, considerando as aplicações práticas em condições de mercado, será possível desenvolver rações espécie-específicas para os peixes e para outras espécies de camarões que venham ser cultivadas. É preciso entender melhor os requerimentos nutricionais das larvas e dos reprodutores, além de necessidades por sistema de cultivo e as potenciais perdas de nutrientes no ambiente, com o objetivo de maximizar a eficiência de crescimento e ganho de peso dos organismos aquáticos.

Estes entendimentos irão proporcionar o uso de ingredientes alternativos com muita segurança, considerando a biodisponibilidade dos mesmos para as diversas espécies e fases de cultivo.

A indústria deverá minimizar ou eliminar o uso de compostos tóxicos ou bioacumulativos (orgânicos e inorgânicos) nas rações, além de aumentar a eficiência das rações considerando os sistemas super intensivos e os sistemas fechados ou com zero troca de água.

Todos estes esforços são pesquisados como objetivo de aumentar a eficiência e reduzir os custos das rações.

Certamente outro grande norteador das indústrias de rações serão os consumidores finais, que estão mais preocupados com a composição nutricional dos organismos aquáticos, com a origem e rastreabilidade dos produtos, com o uso ou não de programas de qualidade e com particularidades dos métodos de cultivo (i.e. uso ou não de químicos, fertilizantes, aditivos, organismos geneticamente modificados, sub-produtos animais ou vegetais, presença de doenças, programas de bioseguridade, possíveis impactos ambientais ou sociais, etc), mas com certeza as maiores preocupações serão com a qualidade e segurança dos produtos (Pearl, 2000).

Inferências:

O Brasil vive dois cenários totalmente conflitantes, de um lado a euforia do setor de produção de grãos devido às expectativas de mercado, e de outro a preocupação dos setores de produção animal devido a instabilidade nos preços das matérias-primas empregadas para a produção de rações.

O momento pode servir de estímulo para a mudança de atitude, como não há o que possa ser feito para deter as variações nos preços das “commodities”, temos que criar e procurar alternativas que atendam as expectativas de toda a cadeia produtiva da aquicultura. Vale lembrar que a cadeia produtiva não engloba apenas produtores e fábricas de ração, mas também fabricantes de equipamentos e acessórios, processadoras de pescado, pontos de venda do produto, entre outros. O esforço deve ser conjunto, pois o sucesso da atividade depende do êxito deste passo. Lembre-se, estamos “todos” no mesmo barco e a culpa é da desunião do setor, o que dificulta a tomada de decisão correta para resolver os problemas.

Certamente, a solução a não virá com um retrocesso no que diz respeito às tecnologias de produção, e sim com a melhora nos índices de produção usando produtos de alto desempenho e ecologicamente corretos, e com a busca de novas alternativas de comercialização.

Referências:

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