Por: Danilo Pedro Streit Jr.
([email protected])
Universidade Estadual de Maringá (UEM).
Gentil Vanini de Moraes ([email protected])
Universidade Estadual de Maringá (UEM).
Com a profissionalização crescente da piscicultura no Brasil, a exigência de qualidade atinge todos os setores da etapa de produção do peixe, não sendo diferente para os produtores de alevinos. A avaliação da patologia espermática pode contribuir para atestar um laudo de qualidade para o sêmen que vai ser utilizado imediatamente, resfriado ou mesmo criopreservado.
Os estudos relacionados ao sêmen dos peixes têm se desenvolvido muito, embora a tecnologia ainda esteja distante daquela empregada na avaliação de sêmen de bovinos. A lenta evolução desses estudos se deve, possivelmente, ao fato da piscicultura profissional ser uma atividade ainda recente, associado também ao fato de que em uma estação reprodutiva os indivíduos machos ainda não são priorizados como as fêmeas, resultando em um número bem menor de pesquisas, se comparada com as realizadas com os reprodutores femininos. Porém, o aumento dos estudos relacionados a criopreservação de sêmen de peixe, fez crescer o interesse na obtenção de um material de boa qualidade, o que vem contribuindo para o maior conhecimento acerca do sêmen de peixes.
A análise de sêmen é relativamente fácil de ser executada e uma série de informações podem ser obtidas através dos resultados. Para que possa ser feita, é necessário antes estabelecer os padrões normais para que qualquer observação fora deste padrão seja capaz de informar se o sêmen está ou não próprio para uso.
Parâmetros como motilidade progressiva, vigor espermático, número total de células produzidas e a concentração de espermatozóides são rotinas para quem trabalha e avalia sêmen de mamíferos. Entretanto, na piscicultura, um laudo de qualidade de sêmen de peixe, em que são levados em consideração todos estes parâmetros, ainda não é realizado em laboratórios que produzem alevinos, muito embora alguns pesquisadores no Brasil apontem para este caminho a fim de profissionalizar este setor da cadeia produtiva.
Buscando aumentar o conhecimento para melhor avaliar o sêmen de peixe, bem como aplicar uma técnica simples e prática, o Laboratório de Reprodução Animal do Departamento de Zootecnia da Universidade Estadual de Maringá (UEM), em conjunto com a Estação de Piscicultura da UEM/CODAPAR adaptou metodologias utilizadas para fixar e corar espermatozóides de mamíferos, para avaliação de patologias do sêmen de peixes.
Patologias
Em mamíferos a patologia dos espermatozóides tem recebido grande atenção por parte dos pesquisadores, já que índices elevados de espermatozóides anormais podem representar baixa fecundidade trazendo desta forma, prejuízos para o produtor. Os índices de espermatozóides anormais podem ser o reflexo das condições de cultivo a que estão submetidos os animais utilizados como reprodutores. Na piscicultura, por vezes, o produtor de alevinos, obtém safras ruins, não se atentando para o fato de que suas matrizes (machos e fêmeas), possam estar vivendo em condições inadequadas e, aí, pode-se citar uma gama enorme de fatores que contribuem para esta situação, como alimentação deficiente, manejo diário inadequado, consangüinidade elevada, densidade elevada de reprodutores, entre muitas outras variáveis que podem influenciar na produção de gametas de qualidade.
A patologia de espermatozóide divide-se em duas categorias: patologias leves (Figura 1) e graves (Figuras 2). A primeira representa espermatozóides que sofrem danos durante o processo de liberação para o meio ou, ainda, no manejo inadequado da extrusão do sêmen e, a segunda, é originada na espermatogênese (formação do espermatozóide). O número de espermatozóides com patologias leves e graves presentes pode indicar a viabilidade ou não do sêmen a ser utilizado.
A técnica consiste em fazer um esfregaço, colocando uma gota de sêmen diluído em um fixador pré-estabelecido, no caso, o formol salino tamponado. Após a lâmina secar, cora-se com rosa-bengala, que tem sido o melhor corante dentre vários testados, (dados em publicação) e avaliam-se 400 espermatozóides, de acordo com as características morfopatológicas pré-estabelecidas que se classificam em espermatozóides sadios (Figura 3), patologia leves e patologias graves.
Dentre as espécies estudadas no Laboratório de Reprodução Animal da UEM, o pacu (Piaractus mesopotamicus), piavuçu (Leporinus macrocephalus), curimba (Prochilodus lineatus) e carpa comum (Cyprinus carpio ) foram observados o índice de patologias leves somada com as graves, em média, de a 35 a 50% (Tabela 1). De acordo com a tabela, os espermatozóides oriundos da carpa comum, pacu e a curimba mostraram índices semelhantes para os parâmetros avaliados todavia o piavuçú, apresentou um índice elevado para o número absoluto de espermatozóides com patologias graves e leves e, como é conhecido o piavuçú produz uma quantidade diminuta de sêmen (0,2 mL em nossos trabalhos) entretanto, ainda não podemos afirmar que este índice seja comprometedor para a fertilização dos ovócitos “a fresco”.
As patologias leves mais encontradas foram: cabeça solta, cauda solta e dobrada. Por outro lado, a microcefalia, cauda quebrada, cauda enrolada e gota proximal foram as patologias graves mais presentes. Em espécies domésticas relacionadas pelo Colégio Brasileiro de Reprodução Animal (CBRA), estes índices de patologias totais não podem exceder a 30% para bovinos e eqüinos e, 20% para caprinos, ovinos e suínos. Estes padrões de patologias, para estas espécies, são utilizados quando se caracterizam o sêmen juntamente com outros parâmetros como vigor, motilidade, pH, concentração, entre outros. Quando a avaliação a ser feita tem por finalidade a congelação e o resfriamento, estes padrões assumem outros valores.
O número de espermatozóides anormais tem uma correlação direta com a taxa de fecundidade em mamíferos, pois em bovinos, mais de 30% de espermatozóides anormais determinam uma taxa de fecundidade em torno de 10%. Uma outra constatação importante, quando se faz avaliação de patologias de espermatozóides, é a verificação da presença de gotas citoplasmáticas presentes nos espermatozóides. Este tipo de alteração espermática, em mamíferos, pode indicar o grau de maturidade sexual do animal (jovem). A gota citoplasmática proximal é considerada leve quando atingir o índice de até 3 % dos espermatozóides (Figura 4a) e de 5% dos espermatozóides quando for gota citoplasmática distal (Figura 4b). Quando os índices dessas patologias ultrapassarem os valores citados pode indicar degeneração testicular.
Em peixes, acredita-se estar correlacionado com a maturidade do animal, pois em mamíferos, os testículos são suscetíveis a mudanças de temperatura corpórea devido a doenças e ao meio, o que pode levar a degeneração testicular.
Em peixes, este índice de patologias pode ser bem maior do que em mamífero, pois características fisiológicas como a produção total de espermatozóides podem, ainda, determinar uma boa taxa de fertilização dos ovócitos. Alguns avanços podem ser considerados relevantes como: avaliação dos crioprotetores usados para congelar o sêmen de Diplodus puntazzo, Macrozoarces americanus, Oncorhynchus mykiss e Salmo trutta, onde verificou-se deformações estruturais na cabeça dos espermatozóides causados durante o processo de congelamento e descongelamento, levando a inutilização do sêmen. A origem das hipófises utilizadas (carpa, frango e coelho), para induzir P. mesopotamicus, L. macrocephalus, P. lineatus e C. carpio na Estação de Piscicultura da UEM/CODAPAR mostrou ser desfavorável para o extrato de hipófise de coelho revelando uma alta incidência de patologias. Entretanto, para se estabelecer parâmetros para avaliação de patologias no sêmen de peixe, serão necessárias mais pesquisas em diferentes espécies para, daí, definir um padrão de sêmen de qualidade.
A patologia espermática pode, em futuro próximo, ser mais uma ferramenta, junto com a concentração espermática, vigor, motilidade progressiva, número total de espermatozóides, dentre outros, para atribuir um laudo de qualidade de sêmen, tornando mais eficiente esta etapa do processo de produção. O mesmo pode servir para verificar a qualidade do sêmen criopreservado, seja para produção ou preservação de gametas de espécies nativas.