Pescadores aos poucos se transformam em aqüicultores
cultivo de peixes em águas estuarinas é um dos mais importantes desafios que a Bahia Pesca vem enfrentando nos últimos anos. O objetivo de desenvolver a piscicultura marinha nos municípios litorâneos do Estado é o de promover a melhoria das condições de vida de marisqueiras e pescadores artesanais, inserindo-os profissionalmente em um dos muitos elos que compõem a cadeia produtiva do pescado cultivado. Nessa empreitada, a Bahia Pesca conta com a participação de importantes parceiros, destacando-se o Sebrae e, a Secretaria de Combate à Pobreza e às Desigualdades Sociais (SECOMP), através do Projeto Boapesca, que se dedica a promover cursos de capacitação e a prover o mínimo de infra-estrutura necessária para que os envolvidos possam se integrar ao trabalho.
Os primeiros resultados desse esforço já são vistos em Taperoá, um município da Costa do Dendê, localizado a 280 km ao sul de Salvador, onde módulos de tanques-rede já estão produzindo as primeiras safras de tilápia Chitralada. Lá, uma bem estruturada unidade de processamento, já em operação, garante a filetagem dos peixes. A conseqüência de tudo isso, é o entusiasmo diante das boas perspectivas que já podem ser vislumbradas pelos pescadores da Colônia de Pesca Z-53.
O uso dos estuários para o cultivo de pescados está entre as melhores opções quando o que se deseja é manter marisqueiras e pescadores artesanais no ambiente em que sempre viveram. Segundo o líder local e presidente da Colônia de Pescadores Z-53, de Taperoá, Luiz Paixão Silva Oliveira (foto abaixo) não há outra saída senão o cultivo de pescados, para atenuar os problemas da escassez da pesca e da super exploração dos mangues pelas comunidades carentes.
Luiz Paixão
Com sua experiência, sabe que os recursos do mangue estão escasseando e que a sua capacidade de ser explorado está no final – “Quando a agricultura fica fraca, o pessoal vem pro mangue, só que o mangue já está com excesso de usuários e não agüenta tanto esforço”, diz Luiz Paixão, apontando com tristeza as inúmeras canoas que na maré vazante saem perigosamente superlotadas de gente, inclusive crianças, para catar mariscos e tudo o mais que puder ser catado, por entre as árvores dos mangues da região (foto abaixo). Não basta, portanto, que o mangue esteja de pé verdejante, é preciso também que sua exploração seja feita de forma sustentável para que continue exercendo a sua função.
A Bahia Pesca iniciou em 2001 as primeiras pesquisas com o objetivo de avaliar técnica e economicamente o cultivo de tilápias em tanques-rede nos estuários de água salgada. Os experimentos foram realizados em localidades ao sul da Bahia: Barra do Serinhaém e Canavieiras, ambos localizados na Baia de Camamu. Os estudos serviram também para conhecer o desempenho da linhagem Chitralada (nilótica) e de um híbrido de tilápia vermelha denominado comercialmente de Red Jamaica.
A experiência revelou importantes aspectos do cultivo, mostrando que ambas as tilápias podem ter um bom desempenho, desde que alguns aspectos ligados à dinâmica das correntezas, sejam respeitados na hora da escolha definitiva do local onde serão fundeados os tanques-rede. Fato comprovado nos módulos instalados na localidade de Canavieiras, que por estarem em local com correntes mais fracas e águas menos salinas, apresentaram resultados bem superiores aos de Barra do Serinhaém, onde as correntes eram fortes e a salinidade bem maior. Possivelmente em decorrência do aumento do gasto energético, a conversão alimentar em Barra do Serinhaém, foi bem mais elevada. Além disso, o estresse fisiológico debilitou os peixes e reduziu a imunidade, o que favoreceu o aparecimento de doenças, elevando a mortalidade.
Além desses aspectos, o que ficou claro ao término dos primeiros testes é que a tilápia Chitralada apresentou ótimos resultados, muito próximos daqueles que alcança quando é cultivado nos tanques-rede das barragens de Paulo Afonso (BA). Detalhes desse experimento realizado pela Bahia Pesca na Baia de Camamu podem ser consultados na Revista Panorama da Aqüicultura n. 72 de julho/agosto/2002.
Taperoá
O trabalho que a Bahia Pesca desenvolve atualmente em Taperoá, está principalmente voltado para a formação dos pescadores, para que possam entender os aspectos do manejo do cultivo dos peixes nas gaiolas e saber como lidar no dia-a-dia com os cuidados de alimentação, biometria, manutenção das estruturas de fixação, etc. A empresa atua implantando o que chama de “módulos de capacitação”, compostos por 12 tanques-rede (2 x 2 x 1,8 m). Dois deles são utilizados como berçários e os 10 restantes para engorda. Uma vez instalado, cada módulo de capacitação passa a ser gerenciado por um grupo de cinco famílias, que se revezam diariamente nas tarefas de manutenção, alimentação e vigilância dos cultivos de tilápia Chitralada
A relação da Bahia Pesca com a tilápia nilótica da linhagem Chitralada vem desde 1999, quando a empresa importou alevinos diretamente da Tailândia. Desde então, três estações da empresa seguem produzido alevinos revertidos, com destaque para a Estação de Piscicultura de Jequié, onde são produzidos os alevinos destinados aos cultivos nos estuários do sul do estado. Uma aclimatação, porém, é necessária, antes de serem colocadas nos berçários de Taperoá. Atualmente, os alevinos de 30 dias e peso médio ao redor de uma grama saem de Jequié (em salinidade 5 ‰ ) para a Fazenda de Camarão da Bahia Pesca, no município de Santo Amaro da Purificação, onde são aclimatados lentamente para a salinidade de 15 ‰, e só então são transportados para as gaiolas bercários.
Nesta fase os alevinos de 1-2 gramas, já aclimatados, são colocados nos tanques-rede que usam inicialmente malha de 4 mm e abrigam, cada um, ao redor de 6.000 alevinos. Após algumas semanas, o saco da rede é substituído por outro de malha de 8 mm, até completar os 60 dias, quando os peixes atingem pesos entre 20 e 30 gramas. Na fase seguinte, os alevinos dos dois tanques berçários são distribuídos pelas 10 gaiolas destinadas à engorda. Cada uma, agora com malha de 17 mm, recebe 800 alevinos, que engordados por mais quatro meses serão abatidos com 700 gramas de peso médio.
Infra-estrutura
Atualmente, a maior parte das tarefas do cultivo já estão sendo realizadas pelos próprios pescadores, que já dominam a montagem dos tanques-rede feitos de estruturas de alumínio, cuja montagem absorve bastante a mão de obra feminina. Através do Projeto Boapesca, a colônia Z-53 recebeu seis canoas motorizadas (foto abaixo) que facilitam o ir e vir até o local do cultivo, bem como permitem o transporte das estruturas de cultivo e ração.
Os custos de produção das tilápias Chitraladas cultivadas no estuário de Taperoá estão hoje ao redor de R$ 2,78. O mesmo peixe, cultivado nas águas doces do São Francisco está sendo produzido ao redor de R$ 2,40. É certo, porém, que os custos de produção no estuário podem baixar ainda mais com a otimização do manuseio, principalmente no que se refere aos cuidados na hora da alimentação, evitando o desperdício e respeitando o apetite dos peixes.
Bem junto ao caís da Ponte Nova, ponto de atracação das embarcações, foi construída uma bem estruturada unidade de processamento (fotos acima). O estabelecimento não foi construído somente para processar as tilápias dos tanques-rede e, atualmente, recebe tilápias de vários municípios da região, bem como beneficia pescados oriundos da pescaria artesanal, o que o mantém em operação todos os dias da semana.