AQUA 2012 – Congressistas de todo o mundo debatem em Praga o futuro da aquicultura

Por:
Rodrigo Roubach1
Luís André Sampaio2
1 Ministério da Pesca e Aquicultura – MPA
2 Universidade Federal do Rio Grande – FURG, membro diretor
do conselho da WAS (2012-15)

A conferência anual da World Aquaculture Society (WAS) em 2012, chamada de Aqua 2012, foi realizada em Praga, República Tcheca, entre os dias 1 a 5 de setembro. A cada seis anos a WAS e a EAS (European Aquaculture Society) organizam um evento conjunto, como os que já ocorreram em Nice na França, no ano 2000, e em Florença, Itália, em 2006.

O encontro de Praga reuniu cerca de 1880 congressistas provenientes de 76 países, incluindo muitos produtores do leste Europeu. Do Brasil compareceram 53 congressistas. Foram submetidos 800 resumos e, ao todo, foram 56 sessões técnicas com apresentação
de trabalhos orais que cobriram os diversos aspectos da aquicultura, um número recorde nos eventos da WAS. Independentemente do tópico, a principal característica dos trabalhos submetidos continua sendo a preocupação com a sustentabilidade ambiental da atividade, seu papel social e a percepção pública da aquicultura. O Aqua 2012
contou ainda com uma feira de produtos e serviços com cerca de 100 estandes, onde estavam expostos equipamentos e ferramentas voltados para o aumento da produção e para facilitar a vida do produtor.

A programação científica e a organização do Aqua 2012 foram elogiadas por todos, e teve à frente a experiência do Dr. “Sir” Michael New. A sessão de abertura contou com a presença do próprio Michael New, do presidente da European Aquaculture Society (EAS), Yves Harache, e do presidente da World Aquaculture Society (WAS), o brasileiro Ricardo Martino, pesquisador da Fundação Instituto de Pesca do Rio de Janeiro (FIPERJ). O tema do evento “Aquicultura Global – Garantindo o Futuro” foi abordado na cerimônia de abertura por Peter Arneson, da Marine Harvest, que falou das perspectivas da indústria, e por Geoff Allan, do Port Stephens Fisheries Institute (Austrália), que ressaltou o papel da
pesquisa como provedora de respostas.

Durante o Aqua 2012 houve a troca de diretoria da WAS. O brasileiro Ricardo Martino deixou a presidência, passando o cargo para Kevan Mai, pesquisadora do Mote Marine Laboratory (EUA), enquanto Michael Schwarz (Virgnia Tech University) assumiu o cargo de presidente eleito. Na mesma oportunidade, Luís André Sampaio, da Universidade Federal do Rio Grande (FURG) e Sandra Shumway, da Universidade de Connecticut (EUA) assumiram seus cargos de membros diretores do conselho da WAS (2012-15).

A diretoria da World Aquaculture Society é composta por 15 membros: ex-presidente, presidente, presidente eleito, secretário, tesoureiro, seis diretores e os presidentes dos quatro capítulos (Latino Americano, Ásia e Pacífico, Coreia e EUA). Do total de 15 posições, o Brasil hoje conta com três membros, sendo o segundo país com maior número de dirigentes na sociedade, atrás apenas dos EUA.

As sessões técnicas cobriram os mais variados campos da aquicultura, como a nutrição (clássica, novos ingredientes e aditivos, alternativas tecnológicas para óleo e farinha de pescado, interação entre nutrição e saúde); genética e biotecnologia; saúde e imunologia; drogas e agentes terapêuticos; reprodução e manejo de reprodutores; larvicultura de peixes; fisiologia e morfologia; manejo da comunidade microbiológica; aquicultura integrada multitrófica e cultivo em bioflocos; sistemas de recirculação; economia
e gerenciamento; avaliação e mitigação de interações ambientais; educação e transferência de tecnologia; aquicultura como meio para alívio da pobreza; políticas e regulamentações para aquicultura, além de muitos outros temas específicos, como sessões sobre cultivo de atuns, bijupirá, esturjão, tilápia, carpas, trutas, salmões, moluscos, ornamentais, crustáceos e plâncton.

Chamou a atenção a presença de uma numerosa plateia em sessões relacionadas com sistemas sustentáveis de aquicultura, como recirculação de água, utilização de bioflocos na produção de peixes e camarões e também a sessão que tratou da aquaponia. O conceito de aquaponia compreende a combinação de aquacultura com hidroponia em um sistema fechado de recirculação de água. O efluente da piscicultura, rico em nutrientes, é utilizado para a produção de vegetais. Uma vez que os nutrientes são assimilados pelas plantas, a água retorna para os tanques de peixes, completando o ciclo.

Rodrigo Roubach, do Ministério da Aquicultura e Pesca (MPA), destacou a sessão que tratou de “Políticas e regulamentação da aquicultura”. Entre as seis apresentações, uma das mais interessantes foi a que apresentou uma qualificação e quantificação dos indicadores da escala de exigências regulatórias existentes nos EUA no âmbito federal e, principalmente no estadual. Os autores elaboraram dois estudos sobre o cenário da aquicultura no país, em 1997 e 2012, e fizeram uma análise contextual e numérica. A pesquisa mostrou que, assim como no Brasil, nos EUA a falta de legislação específica para determinadas atividades que envolvem aquicultura ainda atrapalha e dificulta o desenvolvimento do setor em diversos estados, havendo também, em muitos casos, uma sobreposição de legislações dos órgãos ambientais e de fomento da aquicultura.
Rodrigo Roubach destacou também a sessão sobre bijupirá, yellowtail e outros peixes marinhos, organizada por Michael Schwarz (Virgnia Tech University) e Ronaldo Cavalli (Universidade Federal Rural de Pernambuco), por conta das oportunidades de expansão da aquicultura marinha brasileira. Schwarz falou sobre a atualidade e as tendências da pesquisa e da produção do bijupirá, cujo principal gargalo ainda é o percentual de juvenil produzido (sobrevivência abaixo de 40%), destacando que o volume da produção mundial em 2011 diminuiu em relação a 2010. Ainda segundo Schwarz, a espécie, mesmo nos
países onde já houve maiores investimentos para sua produção, ainda carece de mais informações.

Dos países latino-americanos, as maiores delegações foram a do Brasil e do México, mas
também estiveram presentes pesquisadores e estudantes da Colômbia, Chile, Argentina,
Equador, Peru e Guiana. Entre os brasileiros, estavam lá representantes das mais importantes universidades, institutos de pesquisa e instituições do país, entre eles: Ricardo Martino (Instituto de Pesca do Rio de Janeiro e Presidente da WAS), Rodrigo Roubach (MPA), Luís André Sampaio (FURG e Diretor da WAS), Maria Célia Portella (CAUNESP e Presidente do Capítulo Latino Americano da WAS), Laura Nakaghi, Lúcia Sipaúba Tavares, Marta Stéfani e Edimir Carvalho (CAUNESP), Hélcio Marques e Júlio Lombardi (Instituto de Pesca), Marcelo Boock e Gianmarco David (APTA), Ronaldo Cavalli, Lilia Souza-Santos e Eudes Correa (Universidade Federal Rural de Pernambuco), Carlos Alberto Silva e Roger Crescêncio (EMBRAPA), Pedro Eymard (DNOCS), Elisabete Macedo Viegas e Carlos Eduardo V. da Silva (USP), Evoy Zaniboni e Alex Nuñer (UFSC), além de vários alunos de pós-graduação de diferentes universidades.

Foram aproximadamente 90 trabalhos apresentados por brasileiros, em forma de pôster e apresentação oral, o que representa aproximadamente 10% do total de trabalhos apresentados no Aqua 2012. A maioria tratou de piscicultura, sendo as espécies mais representadas o pacu, tilápia e o bijupirá. Também foram apresentados trabalhos sobre
carcinicultura, produção de bivalves e outros moluscos, ranicultura e ouriço. Os principais temas estudados foram reprodução (11 trabalhos), nutrição (9 trabalhos), patologia/
parasitologia (7 trabalhos), tanque-rede (6 trabalhos) e processamento de pescado (6 trabalhos). Outros temas menos tradicionais foram apresentados por equipes brasileiras,
incluindo educação em aquicultura, legislação, rizipiscicultura e uma nova linha sobre o potencial do cultivo de halófitas com efluente de fazendas de camarão.

Maria Célia Portela (CAUNESP) chamou a atenção para o fato de que as apresentações orais dos pesquisadores brasileiros atraíram muito a atenção da comunidade internacional. Segundo ela, “isso reforça, mais uma vez, a qualidade da pesquisa brasileira no campo da aquicultura e nos coloca em situação privilegiada no cenário mundial”.

Adriana Muñoz-Ramírez, pesquisadora colombiana que concluiu sua pós no CAUNESP, e que hoje leciona na Universidad Nacional de Colombia, juntamente com seu colega, professor Gustavo Alvaro Wills Franco, apresentaram no evento AQUA2012 os
resultados dos trabalhos em nutrição. Ambos fazem parte do Grupo de Investigación UN-ACUICTIO que visa estratégias para incorporar valor agregado aos produtos da aquicultura, como filés de tilápia orgânicos ou com perfil melhorado de ácidos graxos ômega-3.

No Aqua 2012 os pesquisadores colombianos priorizaram as palestras do tema “desenvolvimento, bem-estar e diminuição da pobreza” e “padrões e certificações. O que mais lhes chamou a atenção foram as estratégias para incrementar o nível socioeconómico de setores vulneráveis da sociedade, realizado por diferentes organizações públicas e privadas trabalhando em países em desenvolvimento (Bangladesh, Sri Lanka, Iraque, Vietnam, Afeganistão, Indonésia, entre outros). Outro
ponto que debatido foi o fato da não inclusão das mulheres ou da sua pouca remuneração na atividade da aquicultura em alguns países. Por outro lado, segundo Adriana Muñoz-Ramirez, foi surpreendente conhecer a importância que a aquicultura tem na recuperação do nível socioeconómico e da segurança alimentar em países que sofrem conflitos armados como Iraque e Afeganistão.

Sobre o tema “padrões e certificações”, um aspecto relevante e muito discutido foi a necessidade de ajustar e unificar os requerimentos para certificação de produtos da aquicultura nos diferentes países, tendo em conta as caraterísticas locais. Segundo Adriana, este tema é da maior importância pois as regulamentações existentes
limitam a comercialização dos produtos em países em desenvolvimento. Além disso, é possível observar que existe um grande número de certificadoras com requerimentos muito diversos que ocasionam confusão para o produtor e o consumidor.


As informações sobre o WAS 2012 foram gentilmente cedidas por Rodrigo Roubach (MPA), Luís André Sampaio (FURG), Maria Célia Portela (CAUNESP) e Adriana Munõz-Ramires (Universidade Nacional de Colômbia). A pedidos fica aqui registrada a beleza da cidade de Praga, com suas construções medievais, castelos, igrejas centenárias, a hospitalidade do povo Tcheco e a sua deliciosa cerveja.