Por:
Sérgio Melo
Presidente do Grupo SM
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www.smgrupo.com.br
A atividade de carcinicultura no Brasil começou a deslanchar a partir de 1997, quando produziu 3.600 toneladas com volume inexpressivo de exportação. A partir daí, a produção teve o seguinte comportamento:
Ao examinarmos o demonstrativo acima, percebemos que tanto a produção quanto as exportações entraram em um ritmo de queda a partir do ano de 2003. A estimativa de produção para 2003, naquela época, era superior a cem mil toneladas. Entre 2003 e 2005, a queda efetiva da produção foi de 22,38%. Se considerarmos a produção que era esperada para 2003, anteriormente mencionada, essa queda alcançaria 30,0 %.
A queda é ainda mais significativa, se compararmos as previsões para 2005, feitas pela Associação Brasileira de Criadores de Camarão (ABCC), no ano de 2003. Esperava para 2005 uma produção de 142.800 toneladas e US$ 370,000,000 para as exportações. (Fonte: Projeto APEX/ABCC). Esses números apontam que a perda de produção atingiu 50,98% e que a queda das exportação alcançou 47,57%.
Enquanto o Brasil registrou estas significativas perdas, nosso vizinho de continente, o Equador estimou para o período entre 2000 e 2005, um crescimento de 147% na produção, saindo de 37.628 toneladas em 2000 para aproximadamente 93.000 toneladas em 2005. Nunca é demais lembrar, que o Equador foi fortemente atingido pela doença da Mancha Branca (White Spot Shrimp Virus –WSSV), que destruiu grande parte dos viveiros do país. Os prejuízos dos carcinicultores equatorianos foram imensos. Em 1997 o Equador atingiu com exportações de camarão a cifra de US$ 875 milhões, enquanto no ano de 2000, os valores não ultrapassaram os US$ 281 milhões, registrando uma queda de 67 % em três anos.
Porém, se olharmos a produção mundial de camarão em cativeiro, nesse mesmo período, perceberemos que o crescimento tem sido uma constante. É fato também, que a maioria dos países produtores de camarão, teve presente algum tipo de doença. Além das doenças, algumas regiões sofreram também com catástrofes naturais, tais como a tsunami, ocorrida há um ano na Ásia.
A grande diferença entre o Brasil e o resto do mundo, com reflexo direto na sua performance, está na visão daqueles que atuam na carcinicultura. Exemplificativamente, tomemos para análise a aqüicultura na Tailândia, que após ter sofrido fortemente com a tsunami recebeu apoio governamental e hoje está praticamente recuperada.
É verdade que no Brasil não tivemos uma tsunami, mas tivemos um período de chuvas atípico, e a presença da enfermidade viral Infectious Myonecrosis Virus conhecida por IMNV, que provocou uma enorme mortalidade. Instalou-se o pânico entre os produtores. Mas, a quem recorrer nessas horas? A quase totalidade dos produtores preferiu ficar calada e ocultar o máximo possível os danos sofridos. O medo é justificado, pois aqueles que deveriam, de fato, fomentar a carcinicultura, contam vantagens e se laureiam quando os números são bons, mas são os primeiros a se omitirem se algo acontece de errado. Não deveria ser assim. É necessário saber identificar empresários incompetentes ou desonestos, daqueles que sofreram danos causados por acidentalidades como os casos mencionados.
A falta de apoio generalizada provocou uma desarrumação no setor carcinicultor. Cada um buscou um caminho para superar seus problemas. Os pequenos produtores, principalmente, buscaram soluções individualizadas para manterem-se vivos. O resultado está aí: queda da produção, endividamento elevado, prejuízos acumulados e inadimplência alta. Tudo isso poderia ter sido evitado se, no Brasil, a exemplo do resto do mundo, a carcinicultura fosse tratada como atividade econômica de interesse do país.
Exatamente na hora em que esses produtores mais precisaram as instituições financeiras fomentadoras da produção, reduziram, suspenderam ou retiraram o apoio financeiro. Muito provavelmente, quando o caos já estiver instalado e o estrago feito, aparecerá um programa para tentar salvar os sobreviventes agonizantes. Infelizmente, esse é o modelo que o Brasil adota para gerenciar suas crises produtivas.
Vale lembrar que a carcinicultura brasileira enfrentou, nos dois últimos anos, a ação antidumping promovida pelos produtores de camarão norte-americanos, fato que ajudou a piorar o quadro anteriormente relatado.
Ainda é possível retomar o crescimento, mas é necessário que tenhamos coragem para tomar medidas firmes e transformadoras. É inadmissível que ainda não tenhamos resolvido a questão primária desse setor, que é a questão ambiental. Ninguém se entende dentro dos órgãos envolvidos.
Recentemente, o Ministério Público Federal no Ceará e o IBAMA ingressaram com uma ação contra a SEMACE e o Governo do Estado do Ceará, por entender que a SEMACE não tem competência para licenciar empreendimentos carcinicultores. Tomamos conhecimento recentemente da existência de uma “Minuta de Decreto Estadual – Ceará”, que “Dispõe sobre o Zoneamento Ecológico-Econômico – ZEE Costeiro do Estado do Ceará”. Fica claro, observando os Artigos 1º e 15º da Minuta do Decreto (ver Box), que o Estado do Ceará não reconhece a carcinicultura como uma atividade que deva ser estimulada.
Os problemas da carcinicultura infelizmente não param por aqui. A Receita Federal, em total desrespeito aos exportadores, ignora o direito de ressarcimento do Crédito Presumido de IPI, do PIS e COFINS Não Cumulativos. Por lei, esses ressarcimentos deveriam ser feitos trimestralmente, mas a Receita Federal tem levado muitos anos. A Receita Federal não editou, sequer, os Atos Declaratórios Executivos determinados pela IN-SRF 466/2004, que dispõem sobre a suspensão da contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS incidentes sobre as receitas de vendas de matérias-primas, produtos intermediários e materiais de embalagens nas vendas efetuadas a pessoa jurídica preponderantemente exportadora. Essa preponderância está definida na norma legal, como sendo de 80% no mínimo de exportação em relação às vendas totais. Por conta disso, as empresas pagam mais caro pelas suas compras de insumos e ao mesmo tempo geram créditos fiscais que a Receita Federal não paga.
Em sã consciência, qual produtor no Estado do Ceará terá estímulo para investir em melhoria da produção, buscar parcerias ou, ao menos, tentar renegociar suas dívidas?
É preciso incluir o camarão cultivado na lista dos produtos estratégicos que efetivamente podem contribuir para melhorar o saldo da balança comercial brasileira, gerar empregos e renda, constituindo-se num importante aliado para os planos de desenvolvimento humano com inclusão social.
É de fundamental importância que a SEAP – Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência da República assuma, de fato e de direito, as rédeas da carcinicultura do país. É inadmissível que outros órgãos subordinados a outros ministérios tenham tanta força, a ponto de inviabilizar e criar uma insegurança jurídica para os produtores e exportadores de camarão.
Com um maior e mais decidido envolvimento dos governos estaduais e federal, é possível que alcancemos, em 2010, a meta de exportação de R$ 1,0 bilhão e a produção de 300.000 toneladas, como previsto pela ABCC, no projeto aprovado pela APEX. Mas, por enquanto, o futuro é sombrio.
Artigos 1º e 15º da Minuta do Decreto que dispõe sobre o Zoneamento Ecológico-Econômico Costeiro do Estado do Ceará
Art. 1º. O Zoneamento Ecológico-Econômico Costeiro do Estado do Ceará, instrumento da Política Estadual do Meio Ambiente e da Política Estadual de Gerenciamento Costeiro, tem por objetivo o planejamento e a gestão territorial da Zona Costeira do Estado, no intuito de promover o desenvolvimento sustentável da região e a melhoria da qualidade de vida da população, através da definição de critérios para o uso e ocupação do solo e os usos dos recursos naturais da zona costeira, servindo como parâmetro para a implementação das políticas públicas voltadas ao desenvolvimento econômico-social do Estado. Art. 15. Os usos estimulados, em face dos ambientes e zonas indicados no art. 8º, bem como as metas ambientais, respeitadas as proibições e limitações decorrentes do enquadramento constante do art. 9º, são estabelecidos de acordo com as potencialidades regionais e usos socioeconômicos, conforme a seguinte distribuição: I – Pólo de Desenvolvimento Turístico 1: Granja; Chaval; Barroquinha; Camocim; Jijoca de Jericoacoara; Cruz; Bela Cruz; Marco e Morrinhos; §1º. Os Planos Estaduais de Ação da Zona Costeira serão elaborados de acordo com os pólos acima especificados, observando-se as potencialidades regionais e usos socioeconômicos. §2º. As áreas propícias à criação de unidades de conservação concentrar-se-ão, preferencialmente, nos Pólos de Especial Interesse Ecológico referidos neste artigo, sem prejuízo da identificação de áreas voltada à manutenção dos processos ecológicos, à biodiversidade e aos demais atributos ecológicos, justificando-se a preservação respectiva no interesse ambiental voltada à regulação do uso e ocupação do solo, localizadas em outros Pólos, conforme identificado nos Planos Estaduais de Ação da Zona Costeira em Diagnóstico Ambiental específico. |