Por: Felipe M. Suplicy, Ph. D.
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Coordenador Geral de Maricultura / SEAP/PR
A Revista Panorama da AQÜICULTURA não possui sessão fixa de cartas, mas, por julgarmos de interesse do setor, publicamos na edição anterior um texto do professor Eurico Cabral de Oliveira Filho, enviado por ele à nossa redação. A repercussão do conteúdo deste texto, porém, mereceu um novo espaço em nossas páginas. |
Brasília, 3 de maio de 2006
Como Coordenador Nacional do Projeto UTF/BRA/066 “Desenvolvimento de Comunidades Pesqueiras”, gostaria de agradecer à carta enviada pelo Dr. Eurico Cabral de Oliveira Filho à redação da Revista Panorama da AQÜICULTURA, e publicada na última edição desta revista, na qual o mesmo manifestou preocupações do setor acadêmico em relação ao projeto. Essa carta levou à realização de uma mesa redonda durante o XI Congresso Brasileiro de Ficologia – XI CBFic, em março, em Itajaí, que permitiu um esclarecimento sobre os objetivos do projeto e uma contribuição dos presentes para o aperfeiçoamento do mesmo. Nesse sentido, alguns aspectos tratados na mesa redonda são trazidos aqui para conhecimento do público que não esteve presente no CBFic.
O projeto UTF/BRA/066 é muito mais amplo do que somente o cultivo de algas. Ele utiliza o cultivo de algas como porta de entrada na maricultura, propondo uma posterior diversificação da atividade aliada à co-gestão dos recursos pesqueiros. Este projeto começou a ser discutido em 2002, antes mesmo da criação da SEAP/PR. Um projeto anterior da FAO, o TCP/BRA/065 realizado entre 2000 e 2002 deu início ao cultivo de algas em pequena escala nos Estados do Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba e a falta de continuidade do projeto a partir de 2003 teve como resultado uma grande frustração de parte das comunidades de Flecheiras e Guajirú – CE, Pititinga – RN e Pitimbú e Acaú – PB.
O Projeto “Desenvolvimento de Comunidades Pesqueiras” iniciará com a retomada das ações e consolidação do cultivo de algas nas comunidades do CE, RN e PB ao mesmo tempo em que estará executando ações que permitirão a diversificação da maricultura a partir do segundo ano. Para isto, no primeiro ano estarão sendo realizadas diversas ações como:
– Contratação de consultores em maricultura que atuarão com extensionistas alocados permanentemente nas comunidades; contratação de profissionais de apoio integral ao projeto para serem alocados nos Escritórios Estaduais da SEAP/PR;
– Contratação de serviços de elaboração dos Planos Locais de Desenvolvimento da Maricultura (PLDM) nos municípios envolvidos com o objetivo de planejar o desenvolvimento sustentável do setor, através do zoneamento de usos dos recursos costeiros e das áreas propícias para a maricultura;
– Contratação de uma socióloga para acompanhar o desenvolvimento do projeto;
– Contratação de serviço de apoio para a elaboração das documentações de registro de associações bem como de serviços de contabilidade pelo período de um ano;
– Custeio de transporte e acomodação para dar continuidade ao acompanhamento das associações pelo pessoal da OCB nos Estados;
– Aprimoramento, ampliação e multiplicação dos módulos de cultivo com o objetivo de proporcionar uma renda de cerca de R$500,00/mês por família;
– Elaboração de um Sistema de Informações Geográficas (SIG) de áreas propícias para maricultura, a ser disponibilizado na esfera federal e estadual nos três estados;
– Contratação de serviços para a realização de cursos de processamento de algas para produção de cosméticos;
– Contratação de serviços para a elaboração de um estudo de mercado para moluscos nos três estados;
– Financiamento de pesquisas aplicadas ao cultivo de algas e a realização de um workshop anual para a avaliação do projeto.
Um aspecto importante do projeto é a articulação interinstitucional no âmbito federal e estadual, através da formação de Comitê Diretivo Nacional (CDN) e Comitê Diretivo Estadual (CDE). No nível federal, pretende-se envolver o MCT (CNPq), o Ministério da Integração, MMA (IBAMA), a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), a Sociedade Brasileira de Ficologia (SBFic), o Ministério da Agricultura, entre outras instituições que poderão colaborar com a execução do projeto. No âmbito estadual, instituições governamentais, universidades, SEBRAE e ONG’s serão reunidas nos CDE’s com o objetivo de proporcionar uma integração interinstitucional em apoio à execução do projeto.
No segundo ano, o projeto prevê a diversificação da maricultura com o cultivo de moluscos, bem como a ampliação para outros Estados envolvendo a mesma abordagem, investimentos e metodologia empregada no CE, RN e PB. As espécies de moluscos que serão cultivadas na etapa de diversificação serão definidas com base nos estudos de mercado realizados no primeiro ano, no interesse das comunidades e na disponibilidade de tecnologia para o cultivo comercial. No terceiro e quarto ano o projeto prevê integrar a maricultura com a co-gestão dos recursos pesqueiros, propondo a preservação e recuperação de estoques sobre-explotados.
Em paralelo, o projeto prevê a formação de uma Rede Nacional de Pesquisa em Algas, rede esta que já foi formada pelo CNPq em 2005. No último Congresso Brasileiro de Ficologia, realizado em março passado em Itajaí-SC, a SEAP/PR se reuniu com a coordenação da Rede Algas, com a SBFic e com o CNPq para discutir a interação entre o projeto da FAO e a atuação da Rede Algas onde foi informado que está previsto o apoio à uma série de pesquisas aplicadas ao cultivo de algas, de acordo com as recomendações constantes do documento elaborado na ocasião da criação da Rede.
No aspecto mercadológico, temos em nosso país um crescente mercado para agar e carragenana e um amplo estudo de mercado realizado em 2001 para a FAO e para a SEAP/PR, chegou a conclusão que existe um déficit nacional de cerca de 1.000 toneladas de alga secas para a produção de agar, e uma taxa anual de crescimento desta demanda da ordem de 5,7%. Em 2005, o Brasil importou 33 toneladas de agar ao valor de US$ 505.000 e 1.834 toneladas de algas secas ao valor de US$ 1.893.000.
O mesmo estudo demonstrou que as indústrias processadoras de agar possuem enorme interesse em aquisição da produção de algas de cultivo, devido á sua melhor qualidade comparativamente às algas extraídas em bancos naturais ou coletadas nas praias.
O cultivo de algas exóticas está sendo amplamente discutido pelo setor produtivo, acadêmico e pelos órgãos governamentais e somente será fomentado de maneira criteriosa e responsável se as instituições brasileiras mencionadas chegarem à conclusão que isto é desejável e possível.
Considerando a amplitude de ações, metas e objetivos, o período de cinco anos previstos e a amplitude do projeto em termos geográficos, os recursos de R$ 12 milhões são plenamente justificáveis. Uma parte dos recursos deverá ser alocada no custeio de missões de acompanhamento da FAO e em custos administrativos nacionais e internacionais, o que referencia internacionalmente o projeto e permite uma futura continuidade e expansão do mesmo para todo o território nacional.
A SEAP/PR e FAO acreditam que os investimentos previstos no projeto estão condizentes com os objetivos propostos. Esse projeto pode significar um marco divisor da maricultura brasileira que poderá ser multiplicado em todo a costa brasileira. Como todo projeto de longo prazo, este também pode ter necessidade de adequações durante a sua implementação visando à garantia de seu sucesso. Neste sentido, acreditamos que os Comitês Diretivos Nacionais e Estaduais proporcionarão valiosas ferramentas de acompanhamento e controle participativo de setores do governo e da sociedade que nos auxiliarão no alcance das metas e objetivos propostos. Além dos Comitês Diretivos, a SEAP/PR convoca também o envolvimento e participação do setor acadêmico, produtivo e da sociedade como um todo na implementação desse projeto, proporcionando mais contribuições no decorrer do processo.