Cultivo de Algas

Da “Marinomia” à Maricultura da Alga Exótica, Kappaphycus alvarezii para produção de carragenanas no Brasil

Autor: Edison José de Paula e Ricardo T. Lima Pereira


O termo “marinomia” não consta dos dicionários da língua portuguesa, tendo sido inspirado em Vinatea, L. (Panorama da Aqüicultura 1996, Vol. 6, no 35), e aplicado como o conjunto das ciências e princípios que regem a prática da maricultura.

A espécie Kappaphycus alvarezii, originária das Filipinas, foi introduzida em Ubatuba, SP, com o objetivo de se desenvolver estudos básicos (“marinomia”) como suporte para a implantação de seu cultivo comercial (maricultura) no litoral brasileiro. A espécie é a principal fonte de matéria prima para produção de carragenanas, hidrocolóides de importância comercial, do qual o Brasil é dependente de importação. A utilização e importância das carragenanas e dos ficocolóides, de uma maneira geral, foram abordados por Oliveira, E.C. (Panorama da Aqüicultura, 1997, Vol. 7, no 41), tornando-se desnecessária sua abordagem neste artigo, bastando mencionar seu principal uso na indústria alimentícia. No presente artigo, procuramos sintetizar uma série de informações e resultados experimentais visando uma primeira abordagem sintética dos problemas, perspectivas e estratégias para o cultivo e processamento comerciais dessa alga no litoral brasileiro.


Situação mundial

A demanda mundial de carragenanas tem apresentado crescimento da ordem de 5% ao ano nos últimos 30 anos, com preços que variam de U$ 10,00 a U$ 30,00/kg, ou mais, dependendo das suas especificações e qualidade. Esta demanda somente pode ser atendida através dos cultivos comerciais das espécies Eucheuma denticulatum e Kappaphycus alvarezii, estabelecidos no início da década de 70 nas Filipinas, posteriormente na Indonésia e recentemente na Tanzânia. As maiores indústrias de processamento localizam-se na Dinamarca, Estados Unidos, França, Irlanda, Espanha, Japão e Coréia, sendo que a matéria prima (alga seca) é importada principalmente das Filipinas, Indonésia, Tanzânia e Chile. Neste último país, conhecido pelo sucesso dos cultivos comerciais de Gracilaria chilensis, alga produtora de agar, não existem cultivos de espécies carragenófitas, isto é, produtoras de carragenanas, as quais são coletadas na natureza. Recentemente, indústrias de processamento foram instaladas nas Filipinas e no Chile, provavelmente pelas vantagens da proximidade da matéria prima e redução dos custos de transporte.

O processamento das carragenanas requer investimentos em instalações e equipamentos, exigindo intensa mão de obra, energia e grande volume de água. Os processos de extração podem ser sofisticados ou simples, dependendo da especificação e qualidade do produto final desejado. Os mais simples são utilizados para a produção de carragenanas denominadas semi-refinadas, empregadas na preparação de rações para animais domésticos, camarões e peixes ou mesmo para consumo humano, especialmente em derivados de leite e carne, dependendo somente das condições de higiene em que são produzidas. Envolvem o simples cozimento das algas em uma solução aquosa alcalina, lavagens sucessivas em água doce, branqueamento, secagem e moagem. Os mais sofisticados e mais caros, empregados para carragenanas refinadas, requerem, adicionalmente, a extração propriamente dita e a filtragem, seguidas da precipitação com álcool ou formação de gel e sua prensagem para remoção da água.

A produção mundial de matéria prima através dos cultivos nas Filipinas, Indonésia e Tanzânia atinge a cifra anual de 100.000 ton., sendo 85% provenientes de uma única espécie, Kappaphycus alvarezii, fonte de carragenana kappa e 15% de Eucheuma denticulatum, fonte de carragenana iota. Embora a produção dessas espécies tenha aumentado muito nos últimos 25 anos, pouco progresso foi obtido nas técnicas de cultivo, que são simples, através da propagação vegetativa. Para uma análise das técnicas de cultivo, consultar Oliveira, E.C. (Panorama da Aqüicultura, 1997, Vol. 7, no 42).

Os cultivos são desenvolvidos com baixos custos de capital inicial e operacional e com mão de obra pouco especializada. As algas secas, conseqüentemente, são comercializadas a baixos preços, sendo este o principal problema referido pelos produtores. O segundo problema em ordem de importância é uma “doença”, conhecida como ice-ice e interpretada como decorrente de estresse ambiental, associado a bactérias. As “fazendas” de cultivo consideradas grandes (0,5 hectare) requerem diversas pessoas para sua operação, enquanto fazendas menores podem ser operadas até mesmo por uma única pessoa, em tempo parcial, como uma atividade complementar à outras rotineiramente praticadas, como a pesca, por exemplo. Assim, os cultivos têm sido considerados como uma boa alternativa de emprego e renda.

Os efeitos ambientais dos cultivos são pouco documentados, mas sugerem aspectos positivos ou negativos, relacionados particularmente com a remoção de nutrientes da água e com a atração, recrutamento e proteção de estágios juvenis de peixes, entre outros organismos. Nas Filipinas, os cultivos têm sido considerados como uma alternativa superior de exploração do ambiente, em relação a muitas outras localmente praticadas.

Cultivos experimentais foram desenvolvidos em diversos países, mas sua implantação comercial ocorreu em poucos, sugerindo muitos fatores determinantes de sua viabilidade, como os custos do plantio, coleta e secagem, transporte, processamento e comercialização.

Situação Nacional

O consumo nacional de carragenanas tem apresentado demanda crescente, particularmente nos últimos anos (500 ton./ano, US$ 5 milhões – CACEX, 1994), sendo que a produção tem-se limitado a cerca de 10 ton./ano, a partir de bancos naturais de Hypnea musciformis no nordeste do país. A única indústria nacional de processamento, localizada no Estado da Paraíba e dedicada principalmente a agar alimentício, depara-se atualmente com a falta de matéria prima, espécies de Gracilaria coletadas em bancos naturais limitados e sujeitos a flutuações. A concorrência com similares importados deve agravar-se momentaneamente pelos baixos preços decorrentes da crise asiática.

Diversos estudos experimentais de cultivo foram desenvolvidos no litoral brasileiro, particularmente com espécies de agarófitas, Gracilaria spp., e com a carragenófita Hypnea musciformis, mas os resultados obtidos não estimularam o estabelecimento de cultivos comerciais. Os principais problemas verificados nestes estudos foram as baixas taxas de crescimento e produção devidas ao epifitismo por outras espécies de algas e à herbivoria por peixes, entre outros fatores. Assim, pode-se afirmar que faltam conhecimentos técnicos que estimulem o cultivo comercial de quaisquer das espécies nativas estudadas, apesar do reconhecido nível acadêmico de diversos grupos de pesquisa locais.

Introdução experimental de Kappaphycus no litoral brasileiro

A introdução da espécie no litoral brasileiro (Processo IBAMA 037/97 GABS/SUPES/SP) foi precedida de amplos estudos sobre seu potencial econômico, seus antecedentes biológicos, ecológicos e em cultivo e dos riscos potenciais dos experimentos de introdução e o projeto conta com apoio do CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico.

As implicações ecológicas da introdução de espécies são difíceis de serem previstas. Diversas hipóteses têm sido propostas para explicar o estabelecimento bem sucedido de algas introduzidas em ambientes fora de sua área de distribuição natural. Essas teorias baseiam-se em atributos intrínsecos das espécies invasoras e/ou em seu papel nas interações com as espécies competidoras e predadoras residentes. Entretanto, são de aplicação restrita aos casos especificamente estudados. No caso das espécies de Eucheuma e Kappaphycus, os diversos exemplos de introdução em vários países forneceram o principal argumento para considerá-las inócuas quando transferidas para novos ambientes. O primeiro passo foi avaliar a sobrevivência e o crescimento da espécie em Ubatuba, SP, no Trópico de Capricórnio. Sendo a alga originária de águas quentes, limpas e rasas, a região de introdução apresenta diversos fatores potencialmente limitantes, como as temperaturas de inverno, muito próximas ao seu limite de sobrevivência (média = 20 oC., mínima = 17,5 oC). Acrescem-se ainda a baixa disponibilidade de luz na região, devida à freqüente turbidez da água e a alta pluviosidade (entre 100 e 500 mm mensais), e fatores bióticos, como a competição com grande diversidade de espécies de algas e a predação por peixes herbívoros. Estabeleceu-se a hipótese de que o cultivo em sistema flutuante suprime ou minimiza alguns desses fatores limitantes, particularmente em relação à luz e herbivoria. No caso, esses fatores potencialmente limitantes foram considerados vantajosos, reduzindo os riscos do experimento de introdução da espécie.

Os experimentos foram iniciados com um ramo com cerca de 2,5 g, proveniente de cultivo experimental desenvolvido no Japão com uma linhagem considerada saudável e produtiva, originária de cultivos comerciais nas Filipinas. O ramo original foi propagado em cultura unialgal durante 10 meses em laboratório, antes da transferência para o mar. Este procedimento permite uma avaliação do estado de sanidade das plantas e elimina os riscos da introdução de espécies associadas.

Conclusões de 2 anos de experimentos em Ubatuba, SP

Os principais resultados, após dois anos de experimento no litoral de Ubatuba-SP, com suas projeções positivas e negativas, estão sintetizados na tabela abaixo.

Tabela 1. Resultados de 24 meses de experimentos de cultivo no mar de Kappaphycus alvarezii em Ubatuba, SP e suas projeções positivas ou negativas
Tabela 1. Resultados de 24 meses de experimentos de cultivo no mar de Kappaphycus alvarezii em Ubatuba, SP e suas projeções positivas ou negativas

Devem ser analisados considerando-se sua escala e contexto experimental, isto é, a linhagem e as técnicas de cultivo empregadas e o local. As taxas de crescimento obtidas variaram com regularidade em função da temperatura, com um mínimo no inverno (4,5% ao dia) e máximo no verão (8% ao dia), sendo geralmente superiores às verificadas nas Filipinas.

Estas altas taxas podem ser explicadas pela maior disponibilidade de nutrientes na região, associada à técnica de cultivo em sistema flutuante, que minimiza os fatores limitantes, de acordo com nossa hipótese inicial. Os teores de carragenanas são, aparentemente, inferiores às citadas para a espécie nas Filipinas, sugerindo relação inversa entre crescimento e teor de carragenanas. Análises comparadas com material proveniente daquele país estão em andamento para uma avaliação mais precisa. Dentre outros aspectos positivos observados, destacam-se, a ausência de “doenças” e de macroalgas epifítas.

A presença, junto às algas, de peixes jovens de diversas espécies de interesse comercial indica aspectos positivos do cultivo no seu recrutamento e proteção. Por outro lado, a ocorrência de animais sésseis, particularmente de ascídeas, embora inócua ao nível experimental, pode ser considerada negativa, tanto para o crescimento das algas, quanto para seu processamento. O efeito da herbivoria por Aplysia foi reduzido e ocasional, enquanto que por tartarugas, mais danoso, ocorreu somente após 24 meses de cultivo.

A perda de fragmentos e de plantas inteiras é indesejável não somente pela perda de biomassa mas também pela sua dispersão no ambiente. Nos experimentos em Ubatuba, verificou-se a perda de 41 plantas completas, representando 1,7 % do total propagado durante 24 meses (2.326), sendo que o desprendimento e perda de fragmentos não foram quantificados. A dispersão no ambiente deve ser analisada sob diversos aspectos relacionados às características intrínsecas das plantas, do local e das técnicas e cuidados no cultivo. A ausência de estruturas de flutuação e a propagação em cultivo sem formação de estruturas de fixação ao substrato são atributos favoráveis da espécie, porque limitam sua dispersão a curtas distâncias e favorecem o afundamento progressivo das plantas, redução do crescimento e morte por diversos fatores ou por lançamento à praia. Efeitos potencialmente negativos podem ser esperados em áreas excepcionalmente favoráveis ao crescimento de ramos desprendidos, como áreas muito protegidas e rasas, com boa transparência da água. Essas condições poderiam favorecer o acúmulo temporário de biomassa e seu posterior lançamento à praia, o que, dependendo da escala, seria prejudicial ao ambiente, à pesca de arrasto e ao turismo. Técnicas adequadas de cultivo e manejo, como a colheita efetuada antes que as plantas atinjam grandes dimensões (500 – 1000 g) seriam necessárias para evitar ou minimizar estes riscos.

Cultivo Experimental de Kappaphycus alvarezii em Ubabtuba - SP
Cultivo Experimental de Kappaphycus alvarezii em Ubabtuba – SP

Um aspecto inesperado nos cultivos em Ubatuba foi a produção de esporos (tetrásporos) durante os meses de verão e outono, considerando-se que a linhagem era considerada infértil. A germinação dos esporos implica no desenvolvimento de plântulas com estruturas de fixação ao substrato (apressórios), sugerindo o risco de seu estabelecimento nas comunidades naturais. Os esporos da linhagem estudada, entretanto, apresentaram baixa viabilidade, tanto em experimentos desenvolvidos no laboratório, quanto no mar, reduzindo a possibilidade daquele risco. As raras plântulas obtidas após grande esforço experimental, mostraram grande variabilidade morfo-fisiológica, sendo muito delicadas e sensíveis. Indicaram, por outro lado, a possibilidade de seleção de linhagens com maiores teores de carragenanas.

Perspectivas e problemas potenciais da maricultura no litoral brasileiro

As altas taxas de crescimento e o comportamento previsível da produção de biomassa, obtidos para Kappaphycus alvarezii na Região de Ubatuba, SP, sugere a possibilidade de cultivo da espécie em grande parte do litoral brasileiro, particularmente em latitudes menores, com temperaturas mais altas. Considerando-se as características da espécie, o maior desafio de sua maricultura é se conseguir alta produção, sustentada e de boa qualidade a preços competitivos. Isto sugere a necessidade de um programa estratégico que contemple o estudo de vários aspectos do seu ciclo produtivo, isto é, cultivo, processamento e comercialização, dado faltarem pesquisas básicas em várias áreas do conhecimento, antes que se possa recomendar a implantação de cultivos comerciais.

As perspectivas para o litoral brasileiro dependem de uma série de estudos, incluindo a avaliação de áreas potenciais mais favoráveis ao cultivo comercial. As áreas mais favoráveis para o crescimento são aquelas com temperaturas entre 20 a 30 oC, salinidades não inferiores a 30 o/oo, alta transparência e boa movimentação da água. Os dois últimos aspectos devem ser considerados em conjunto com as técnicas de cultivo. Embora a movimentação da água seja favorável ao crescimento das plantas, áreas protegidas de grandes ondas e com pequena amplitude das marés, permitem a fixação de sistemas mais simples e econômicos de cultivo. Sistemas de cultivo flutuantes minimizam alguns fatores limitantes, decorrentes da turbidez da água e herbivoria, como indicado pelos experimentos de Ubatuba. Dentre os problemas potenciais do cultivo destacam-se as limitações de natureza abiótica ou biótica, que podem dizimar os cultivos depois de meses de aparente sucesso; a predação, particularmente por peixes, entre outros herbívoros, que pode inviabilizar o cultivo em áreas favoráveis; animais sésseis, ex. ascídeas e outras pragas, que podem reduzir a produção ou sua qualidade e, o balanço entre crescimento e teor de carragenanas que pode ser determinante da viabilidade dos cultivos comerciais.

Cultivo suspenso de Kappaphycus alvarezii - Ubatuba - SP
Cultivo suspenso de Kappaphycus alvarezii – Ubatuba – SP

A viabilização comercial dos cultivos, entretanto, depende ainda de muitos outros aspectos sócio-econômicos, entre outras características regionais. A priori, características potencialmente favoráveis ou desfavoráveis podem ser enumeradas para diferentes regiões. A título de exemplo, pode-se comparar duas situações extremas, representadas pelo litoral sudeste e nordeste brasileiros. No litoral sudeste, a presença de baías relativamente protegidas, particularmente nos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro, indicam excelentes condições para o crescimento da espécie. Associada a estas características, a pequena amplitude das marés na região (cerca de 1 m), permite o cultivo em sistemas flutuantes, relativamente simples e posicionados próximo à costa. Essas regiões, entretanto, apresentam clima úmido e chuvoso, podendo implicar na necessidade da secagem artificial das algas ou alternativas de processamento diretamente a partir das algas frescas. Áreas do litoral nordeste, por outro lado, apresentam maiores amplitudes de marés (cerca de 2 m) e praias com baixa declividade, sendo relativamente expostas ao mar aberto. Estas características sugerem maiores esforços na implantação dos sistemas de cultivo, posicionados mais distantes da linha de costa. Por outro lado, apresentam outros aspectos favoráveis, como o bom crescimento da espécie em temperaturas altas; maiores teores de carragenanas em águas oligotróficas; maior disponibilidade de energia solar, importante para o crescimento e secagem natural das algas; a existência e disponibilidade de mão de obra, distribuída em vilas de pescadores que se dedicam a coleta e secagem da alga Gracilaria e, a existência de infra-estrutura estabelecida para processamento.

Conclusões

A “marinomia”, entendida como o conjunto das ciências e princípios que regem a prática da maricultura, tem compromissos e responsabilidades com o conhecimento e com sua aplicação. A maricultura da espécie em questão, tem implicações sócio-econômicas e ambientais e depende da motivação e esforços coletivos. Neste contexto, devem ser consideradas as questões sobre para que e para quem desenvolver estas pesquisas e sobre as ações e investimentos públicos e/ou privados necessários. O interesse e a participação de setores da iniciativa privada são fundamentais para avaliação do potencial sócio-econômico e das estratégias para sua viabilização. Na fase atual, as perspectivas da maricultura da espécie, entretanto, ainda estão na dependência da “marinomia”, recomendando-se a coordenação de esforços e de experiências de grupos de pesquisa locais. Sugere-se o investimento em experimentos em pequena escala, coordenados, visando à avaliação de áreas potenciais de cultivo, empregando-se técnicas adaptadas às características locais.

Simultaneamente, sem custos adicionais, podem ser testadas algas nativas, particularmente a agarófita Gracilaria, visando a seleção de linhagens. Os experimentos devem ser desenvolvidos com linhagens provenientes de cultivo unialgal em laboratório para evitar a transferência simultânea de espécies associadas, considerada um dos principais riscos da introdução de espécies exóticas. Devem ser delineados para permitir a avaliação sazonal das taxas de crescimento e produção, teor e qualidade das carragenanas, estado de sanidade, assim como a ocorrência e influência do epifitismo, dos animais associados e da herbivoria, e os riscos ambientais da dispersão.


A opinião de quem processa algas no Brasil

A seguir, entrevistamos Jun Setoguchi, diretor da Agar Brasileiro Indústria e Comércio Ltda., empresa localizada em João Pessoa – PB, e única indústria no Brasil que vem, nos últimos 23 anos, processando algas para produção de agar e carragenanas.

Que algas sua empresa processa?
Setoguchi
 – Para fabricação do agar, processamos principalmente a alga Gracilaria, proveniente da região que abrange desde o litoral de Pernambuco até a divisa norte do Ceará. Para a obtenção de carragenanas processamos a Hypnea e também um pouco de Gigartina.

A Agar Brasileiro se dedica mais a produção de agar ou carragenana?
Setoguchi 
– Produzimos mais agar. Quase 90% do total.

Os estudos do Dr. Edison mostram que a Kappaphycus alvarezzi pode ser cultivada em diversas partes do litoral brasileiro. Seria interessante o incentivo desse cultivo para a indústria já estabelecida?
Setoguchi
 – Interessante é, mas é preciso ver se é interessante sob o ponto de vista econômico. Não interessa ter a alga ao lado da fábrica se isso custar mais caro do que trazê-la de fora. Das Filipinas, por exemplo, que consegue produzir a alga a um preço muito barato por ter matéria prima e mão de obra muito em conta.

A Agar Brasileiro está importando algas?
Setoguchi
 – No momento não, mas temos projeto de importar a Kappaphycus seca para começar um processamento.

A que preço podem ser adquiridas hoje?
Setoguchi
 – As algas custam de 700 a 800 dólares a tonelada seca, entregue no porto no Brasil com frete pago. Mais impostos, vão chegar a um custo final de aproximadamente US$ 1.000 a tonelada.

As Filipinas têm oferecido algas com freqüencia?
Setoguchi 
– O Japão era um grande consumidor de algas das Filipinas e diminuiu sua procura. A oferta para nós aumentou muito, inclusive, fazendo o preço cair.

Qual o consumo de carragenanas no Brasil? Além do produto importrado existe espaço para a indústria nacional?
Setoguchi
 – O mercado é grande e o consumo brasileiro gira em torno de 350 a 400 ton/ano, mas a carragenana difere muito de uma aplicação para outra. Para o uso de alimentação para cachorro por exemplo, custa em torno de US$ 5 por quilo e para aplicação em leite, US$ 18. Têm várias empresas que importam e estão oferecendo as carragenanas no Brasil. O Chile, que é um grande produtor de carragenanas é um deles. A alga sai de lá sem imposto de importação, pois pagam só o ICM e geograficamente, estão mais perto de São Paulo do que nós na Paraiba. Essa proximidade em termos de frete faz uma diferença grande. Para sermos competitivos é preciso que tenhamos uma matéria prima muito barata.

Caso houvesse um parque de cultivo na região sudeste, seria comercialmente interessante ter uma ampliação da sua empresa também na região sudeste?
Setoguchi
 – Teríamos que montar uma fábrica nova e isso não é um investimento barato. Para o tamanho da nossa indústria sairia muito caro e não sei se valeria a pena. Teríamos de processar muitas algas. Para se ter uma idéia, para cada 1000 quilos de algas, tiramos 100 a 200 quilos de produto refinado.

Faz sentido afirmar que não interessa fazer uma produção grande por não ter para quem vender o produto?
Setoguchi
 – Exatamente. Acredito que no litoral de São Paulo e Rio de Janeiro o cultivo deve ficar inviável porque a mão de obra nessa região é mais cara que na região nordeste. Em termos de custo, certamente em São Paulo um cultivo ficará mais caro, a não ser que seja um cultivo grande, do tipo que gera 30 toneladas secas por mês, o que significa dizer cerca de 150 toneladas molhadas. Pelo menos isso, caso contrário, se tornará inviável em termos de custo, a não ser que se consiga fazer o cultivo trabalhando com poucas pessoas e, teoricamente, se precisa de muitas pessoas no mar para que seja viabilizado um cultivo. Mas,veja bem, estou falando do que eu apenas imagino, não existe nenhum estudo meu sobre isso.


*Autores: Edison José de Paula – Departamento de Botânica, Instituto de Biociências, USP – Fone: (011) 818-7544 / 818-7555 – e-mail: [email protected] 

Ricardo T. Lima Pereira – Inst. de Pesca, Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo – Fone: (012) 432-1254