A experiência bem sucedida da Noruega tem muito a nos ensinar
Em agosto participei, a convite da Innovation Norway, agência de desenvolvimento da Noruega, do Aqua Nor, possivelmente o maior evento da aquicultura mundial. Mais uma vez fui fazer o que gosto. Mergulhei em um ambiente repleto de inovações, respirei aquicultura 24 horas por dia, e conversei com pessoas realmente comprometidas com a produção de pescado, com a sustentabilidade dos empreendimentos e, principalmente, com a preservação do meio ambiente, um tema da maior importância, não à toa presente, direta ou indiretamente, em todas as conversas que tive. Por tudo isso, agradeço a Renata Prado e Øystein Valanes pela oportunidade, acolhida e suporte recebido ao longo dessa viagem.
Já escutei por muitas vezes a afirmação de que a salmonicultura norueguesa “é uma indústria baseada no conhecimento”, e, por pouco não a percebi como mais um clichê, desses que estamos habituados a criar para a aquicultura brasileira, todas as vezes que falamos do nosso enorme potencial, da extensa costa, da grandeza dos reservatórios e até do suposto protagonismo que teremos na produção de alimentos para as futuras gerações do planeta.
Longe de ser clichê, na Noruega me deparei com a força da ciência e do conhecimento movendo uma gigantesca e próspera indústria aquícola. A estreita parceria do setor produtivo com a academia permite que a atividade seja permanentemente abastecida com o melhor que o conhecimento científico pode gerar, seja para oferecer soluções triviais do dia a dia, ou mesmo para conceber a Ocean Farm 1, uma mega estrutura offshore, a maior já construída para cultivar peixes distantes de doenças e sem os impactos ambientais causados pelas formas tradicionais de cultivo. Por tudo o que vi e ouvi, faço coro com os que afirmam que hoje a Noruega pratica a mais bem sucedida aquicultura do mundo e ela é, sim, baseada no conhecimento.
Dito isso, quero contrapor com o cenário vivido pela aquicultura no Brasil. Diferentemente dos demais setores produtivos da agropecuária, a pesquisa aquícola brasileira nasceu nas universidades, e não erra quem diz que a própria aquicultura no país nasceu dentro do ambiente acadêmico, nessas mesmas universidades que hoje enfrentam um cenário de cortes de bolsas e sofrem com a penúria de recursos para financiar projetos de pesquisa.
A preocupação aumenta mais quando nos damos conta de que o modelo brasileiro de pesquisa é absolutamente dependente dos alunos de pós-graduação e que, sem eles, não há condições de realizá-la. Portanto, também não erra quem diz que sem as bolsas não há alunos de pós-graduação e sem esses alunos não há pesquisa.
Ao longo dos últimos anos temos experimentado um crescimento acanhado, como nos revelam os últimos dados do IBGE para a produção aquícola em 2018, cujos números publicamos nessa edição. Não temos muitos motivos para comemorar, e os desafios continuam nos envolvendo, principalmente os sanitários. Não custa lembrar que todas as pesquisas na área de doenças emergentes, diagnósticos, tratamentos e desenvolvimento de vacinas para peixes são feitas dentro das universidades, e esse trabalho já se encontra impactado com os recentes cortes das bolsas de pós-graduação.
Enquanto isso acontece aqui, o conhecimento segue avançando mundo afora, e de forma rápida. Ao pararmos de investir, só nos restará observar produtores de outros países produzindo mais, obtendo melhores produtividades e maior competitividade. Não iremos longe sem o conhecimento.
Voltei pra casa com a impressão de que os noruegueses não falam do futuro, sem que ele já esteja totalmente planejado em alguma prancheta ou, quem sabe, até sendo testado em algum modelo de pequena escala. E você leitor, já parou pra pensar na aquicultura que o Brasil vai estar praticando daqui 10-20 anos?
À todos uma boa leitura,
Jomar Carvalho Filho
Biólogo e Editor