Editorial – edição 101

Jomar Carvalho Filho

Eu era ainda criança quando escutei pela primeira vez que os japoneses reservavam para o seu mercado interno os melhores produtos que podiam fabricar, e que a sobra era vendida para outros países.

Acho que muita gente já deve ter escutado isso. Lembro-me que achei aquilo o máximo, mas até hoje não sei até que ponto isso era verdade. O fato é que nunca mais esqueci do país que reservava para o seu povo o que de melhor conseguia produzir, e isso só serviu para aumentar minha admiração pelo distante Japão. E como era distante pra mim, o país do meu super-herói National Kid. Awika!

Nessa mesma época ganhei de presente um radinho portátil, que pra funcionar precisava apenas de duas pilhas pequenas. Era de longe a maior novidade eletrônica que um moleque brasileiro podia sonhar. O tal radinho era uma verdadeira jóia fabricada no Japão, que vinha protegido por uma capinha de couro marrom, e que podia até ficar apoiado numa pequena aba flexível. O presente parecia ter sido feito sob medida para andar grudado nos meus ouvidos. Diante da minha nova paixão, eu tentava imaginar como deveriam ser maravilhosos os radinhos que não eram exportados, já que o que produziam de melhor ficavam para as crianças japonesas.

No Brasil, infelizmente não era assim. O país do café, não reservava para nós os seus melhores grãos. Eu não conhecia ninguém que havia provado do melhor café brasileiro, sabia apenas que ele existia, mas que as sacas com as melhores seleções seguiam direto para o Cais do Porto, rumo ao exterior. Assim foi também com as laranjas e com outros tantos produtos de altíssima qualidade, que nós brasileiros nunca tínhamos acesso, e que eram destinados apenas aos consumidores do lado de fora do país.
Quando vi os produtores de camarão se voltando com disposição para o mercado interno, todas essas lembranças me vieram. Uma viagem às avessas imposta pela desvalorização cambial, que está obrigando a indústria do camarão cultivado a olhar com mais atenção, não só para os nossos supermercados, peixarias e feiras livres, mas também para o bolso do consumidor brasileiro, que anda um pouco mais recheado.

O melhor do camarão cultivado estará agora sendo consumido no mercado brasileiro e o setor está apostando alto no sucesso dessa mudança. Teremos a oportunidade de comer um produto processado em estabelecimentos com SIF, com controle de resíduos, tudo como exige, por exemplo, a Comunidade Européia. Sorte de nós consumidores.

A ocupação do mercado interno pela indústria do camarão brasileira é um dos muitos assuntos que tratamos nessa edição. Trazemos também um artigo sobre o cultivo de tilápias em açudes particulares, uma reflexão sobre os problemas climáticos e seus efeitos na aqüicultura e muito mais…
A todos, uma ótima leitura,

Jomar Carvalho Filho
Biólogo e Editor