Editorial – Edição 78

Os países da União Européia e os EUA estão cada vez mais exigentes no que se refere à qualidade dos pescados que importam, obrigando seus parceiros comerciais a exercerem uma atenção redobrada com a rastreabilidade da origem dos produtos que estão adquirindo. As autoridades desses países alegam que a extrema segurança alimentar reflete tão somente o desejo da sociedade de ingerir alimentos inócuos e comprovadamente saudáveis. Já no Brasil, o olhar firme das autoridades muitas vezes se transforma em vista grossa, especialmente quando a fiscalização sanitária é barrada pela grande rede de informalidade do comércio de alimentos, principalmente o de pescados. Um exemplo disso é o que está ocorrendo atualmente na borda do reservatório de Barra Bonita, um dos mais eutrofizados do Estado de São Paulo, captador de muita poluição industrial e orgânica.

Denúncias têm chegado a redação da Panorama da Aqüicultura apontando o grande comércio de tilápias que vêm abastecendo não somente o CEAGESP, mas atacadistas e grandes cadeias de supermercados no Estado de São Paulo. São toneladas semanais provenientes da pesca na represa de Barra Bonita, com desembarques diários expressivos nas localidades de Rio Bonito e Bairro dos Mineiros, em Botucatu. Além do peixe inteiro, cresce também o comércio decorrente da filetagem feita a céu aberto nas margens da represa, sem qualquer higiene. São peixes que variam de 100 gramas a 1,5 kg e rendem aos pescadores de R$ 0,50 a 1,20 o quilo. Os preços, de tão atrativos, já conquistaram até supermercados que tanto se orgulham da rastreabilidade de seus produtos.

Mas não são somente os paulistas que estão consumindo tilápias engordadas no caldo de esgoto doméstico lançado no médio Tietê. Das margens da Barra Bonita partem, semanalmente, dois caminhões abarrotados de tilápia para o mercado de Fortaleza – CE, certamente sem que sejam importunados por qualquer barreira sanitária.

Nos últimos anos temos acompanhado o grande esforço que os produtores de tilápia têm feito para processar seus produtos dentro dos rígidos parâmetros estabelecidos pelo Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal, do MARA. Muito dinheiro tem sido investido para tornar a tilápia um produto de qualidade, confiável e seguro. Nunca se falou tanto nas qualidades culinárias deste peixe como atualmente e, como resultado, muitos restaurantes famosos deixaram o preconceito de lado e passaram a ostentar com orgulho a tilápia nos seus cardápios. Além disso, muitos investimentos para agregar valor ao peixe vêm se fixando no mercado, entre eles a tilápia da Sadia e, mais recentemente, a tilápia enlatada, comentada nesta edição. Sabemos que é preciso muito tempo, trabalho e dinheiro para construir uma imagem positiva no mercado, que pode, no entanto, ser jogada no lixo nos poucos segundos da notícia de um telejornal associando o peixe ao esgoto doméstico, salmonelas e coliformes fecais.

Problemas de mercado, no entanto, não são um privilégio dos tilapicultores, já que a conquista do mercado será ainda por muito tempo o grande desafio para todos os profissionais da aqüicultura. Um bom exemplo é a grande batalha que neste momento está sendo travada pelos carcinicultores brasileiros, por terem sido acusados por associações de pescadores americanos de estarem praticando dumping na comercialização dos seus produtos nos EUA. A ABCC – Associação Brasileira de Criadores de Camarão já se mobilizou para provar nos tribunais americanos que a carcinicultura nacional jamais desfrutou de qualquer privilégio de incentivos e subsídios provando, portanto, que são injustas as acusações.

Como é possível ver, o que conta na hora de enfrentar desavenças é a coesão e a credibilidade. A todos uma boa leitura,

Jomar Carvalho Filho
Biólogo e Editor