Muitos já ouviram falar da empresa Ocean Garden e da sua força no mercado norte americano de pescados, com sua publicidade sempre presente nas principais publicações especializadas. Por estar sediada em San Diego na Califórnia, muita gente acredita tratar-se de uma empresa americana, desconhecendo que na verdade a Ocean Garden é uma empresa estatal mexicana que há 30 anos se dedica a comercializar profissionalmente pescados mexicanos nos principais mercados mundiais. Nos últimos anos essa empresa vem comprando todo o camarão cultivado pela indústria aqüícola mexicana, oferecendo ainda um importante apoio financeiro ao antecipar aos produtores parte do pagamento da safra, antes mesmo dos viveiros virem a ser povoados. O engenheiro mexicano Alejandro Flores Tom, presidente da Cámara Nacional de la Industria Pesquera – CANAINPES, em sua visita recente ao Brasil onde fez uma palestra no Aquacultura Brasil ’98, concedeu uma entrevista a Panorama da AQÜICULTURA na qual falou sobre a importância da Ocean Garden no desenvolvimento da aqüicultura mexicana e da mudança que essa indústria sofrerá com a possível privatização da empresa, após ser incorporada ao Bancomex.
Panorama – Há quantos anos existe a Ocean Garden?
Alejandro – Tem aproximadamente 30 anos de vida. É uma empresa do governo mexicano criada com o objetivo principal de comercializar os pescados mexicanos no estrangeiro. Esta foi a filosofia que motivou sua fundação.
Panorama – Quando fala em estrangeiro, você está falando também de outros países que não os EUA?
Alejandro – Definitivamente. Mesmo que por sua proximidade o mercado natural do México seja os EUA, há incursões no mercado europeu e asiático. A idéia é ter uma frente comum de comercialização como país, para os principais produtos pesqueiros do México, entre eles o camarão, o abalone e a lagosta, espécies de alto valor comercial.
Panorama – Nos últimos 30 anos, como é possível avaliar a importância da Ocean Garden no crescimento da produção camaroneira mexicana?
Alejandro – Seu papel sempre foi muito importante, eu diria mesmo fundamental. Graças a ela foi consolidada a pesca e uma parte da aqüicultura do México. A Ocean Garden tem sido uma promotora da aqüicultura do camarão e inclusive acompanha os produtores em todo o processo. Em algumas ocasiões lhes paga antecipadamente por conta da produção que irão comercializar.
Panorama – Como funciona este pagamento antecipado?
Alejandro – O aqüicultor firma um contrato com a empresa e se compromete a lhe entregar toda a produção a preços de mercado. Há uma tabela que sai semanalmente com informações baseadas no mercado internacional e, no momento da venda, o preço que vale é o desta tabela.
Panorama – Quais os critérios utilizados para o pagamento das antecipações?
Alejandro – Estima-se a capacidade de produção da fazenda e a safra que o produtor poderá obter. Através disso, determina-se um percentual que normalmente é de 10%, podendo até ser mais, dependendo da qualidade do produtor e da experiência que a Ocean Garden tem com este produtor. Por exemplo, se for um cliente de muitos anos entregando o seu produto, pode melhorar muito o percentual de sua safra que lhe será pago antecipadamente.
Panorama – De que forma esses pagamentos antecipados são utilizados pelos produtores?
Alejandro – Grande parte dessas antecipações é destinada à compra de pós-larvas e alimentos balanceados.
Panorama – Há somente uma antecipação por cada período de engorda?
Alejandro – Não necessariamente, pois podem outorgar essas antecipações em diferentes entregas, a medida que o produtor for requerendo. Esta é a forma tradicional que a Ocean Garden tem participado junto com os aqüicultores e também com os pescadores de camarão. Entretanto, houve uma mudança na política da empresa, que agora passou a fazer parte do BANCOMEX – Banco Nacional de Comércio Exterior do México e, ao fazer parte da estrutura de um banco, seguramente as políticas da empresa deixarão de ser como são neste momento, para converter-se em políticas de banco, o que pode ser uma vantagem ou uma preocupação. Até agora os produtores estavam acostumados a receber parte de seus pagamentos antecipados de uma empresa comercializadora e, a partir de agora, possivelmente terão que agir como se fossem tomar um empréstimo bancário.
Panorama – E como os produtores de camarões estão recebendo essas mudanças?
Alejandro – Bem, há uma grande preocupação por parte dos produtores porque a indústria da aqüicultura no México está apenas em crescimento, não está ainda consolidada. Isso quer dizer que muitas fazendas têm dívidas a serem pagas relacionadas ainda com suas implantações. Logo, de acordo com os critérios financeiros dos bancos mexicanos, essas fazendas terão restrições a novos créditos. Assim, quando a Ocean Garden deixar de antecipar parte de seus pagamentos, passando a fornecer empréstimos, muitas fazendas não terão acesso aos recursos que tinham anteriormente.
Panorama – Se o governo brasileiro ou qualquer outra organização vier a desempenhar um papel semelhante ao da Ocean Garden, que alerta você faria sobre erros que não deveriam ser cometidos?
Alejandro – O principal problema não é de mercado nem de comercialização e sim um problema de financiamento. Se no Brasil existir um programa financeiro de apoio à aqüicultura, será excelente, mas se for como no México que não há um programa definido, será um problema grave. Se houver uma preocupação com o fomento da aqüicultura mas não houver planos de financiamento que o suporte, será apenas demagogia. O ideal é que, no momento em que o produtor for buscar os recursos, tenha a seu favor um programa nacional de fomento, que viabilize qualquer compromisso com instituições financeiras, bancos, fundos, etc. Existem muitas opções para oferecer créditos aos aqüicultores. A meu ver, o problema mais grave que os aqüicultores podem enfrentar é a não existência de uma política financeira de apoio à aqüicultura. A Ocean Garden, nesses últimos anos, através das antecipações e da certeza de comercialização, ofereceu apoio financeiro e não financiamento. Agora, com essas mudanças, serão criadas muitas situações de conflito pois não existe um planejamento e uma política de apoio financeiro para a aqüicultura mexicana.
Panorama – É verdade que há um interesse na privatização da Ocean Garden?Alejandro – Sim, é verdade, em fevereiro de 1999 ela estará a venda. Já se tentou vender em outras ocasiões, mas as ofertas recebidas pelo governo nunca foram suficientes e agora haverá uma nova oportunidade para os interessados.
Panorama – A Ocean Garden terá a mesma finalidade se for privatizada?Alejandro – Nós não sabemos. Uma instituição dirigida principalmente para comercializar produtos nacionais, ao ser vendida, poderá ter outros interesses econômicos distintos…
Panorama – Na sua opinião a venda da Ocean Garden em fevereiro será fácil?Alejandro – Eu acho que não será vendida, pois a empresa está crescendo muito, tendo obtido resultados positivos muito favoráveis nos últimos dois anos. Em decorrência disso e eu creio que o valor para a venda será muito alto, dificultando o negócio. Essa é minha opinião particular…
Panorama – As processadoras de camarão pertencem à Ocean Garden?Alejandro – Nenhuma pertence a Ocean Garden, são empresas que a Ocean Garden dá uma licença para processar o camarão com a sua marca, supervisionando o controle de qualidade de todas as plantas.
Panorama – Há também antecipações para essas empresas?
Alejandro – Sim, a Ocean Garden tem muito interesse em fomentar a cultura de processamento de boa qualidade.
Panorama – Falemos um pouco sobre a CANAINPES que é a instituição a qual você preside.
Alejandro – A Cámara Nacional de la Industria Pesquera tem 50 anos de existência e a sessão de aqüicultura na câmara tem apenas cinco anos. A indústria de camarocultura no México tem 10 anos de vida e faz 5 que estamos na Câmara o que é muito importante porque inclui toda a indústria pesqueira.
Panorama – Há conflitos entre os pescadores e os aqüicultores?
Alejandro – Sim, sobretudo com os pescadores de camarão e os aqüicultores. Mas com o passar do tempo entenderam que a pesca extrai e que a aqüicultura multiplica recursos. Apenas com um só reprodutor que tiramos do mar produzimos muito mais camarões. Na próxima semana teremos um reunião do Conselho Nacional da CANAINPES onde provavelmente mudaremos o nome para Cámara Nacional de las Indústrias Pesqueiras e Acuícolas, que será um reconhecimento do potencial de crescimento da aqüicultura mexicana, um progresso…