O lançamento do livro “Plataforma NutriAqua – Base de dados com exigências nutricionais de espécie de interesse para a aquicultura brasileira”, coincidiu com o fechamento da nossa última edição 133, razão pela qual ganhou apenas uma pequena nota na sessão Notícias & Negócios, tendo sido impossível, na ocasião, fazer a merecida divulgação desse importante trabalho, resultado do esforço conjunto de 40 pesquisadores com conhecimento em nutrição de peixes, coordenados pelo professor da ESALq/USP José Eurico “Zico” Possebon Cyrino e a professora da UFSC, Débora Fracalossi, atual presidente da Sociedade Brasileira de Aquicultura e Biologia Aquática – Aquabio.
Nessa entrevista, originalmente concedida à Aquabio (www.aquabio.com.br), o leitor vai tomar conhecimento do que é e com que objetivo a Plataforma NutriAqua foi concebida. José Eurico Possebon Cyrino possui graduação em Zootecnia na Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, mestrado em Biologia de Água Doce e Pesca Interior no Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, doutorado e pós-doutorado em “Fisheries and Allied Aquacultures” na Universidade de Auburn e o grau de Livre-Docente pela Universidade de São Paulo. Atualmente é professor associado da Escola Superior de Agricultura – Luiz de Queiroz, da Universidade de São Paulo. Tem experiência na área de Recursos Pesqueiros e Engenharia de Pesca, com ênfase em Aquicultura e atua principalmente na produção e nutrição de peixes de água doce.
A Plataforma NutriAqua é uma parceria entre quarenta pesquisadores com conhecimento em nutrição de peixes. Para quem esse projeto é direcionado?
José Eurico – O livro, resultado deste projeto, é direcionado a todos os pesquisadores e técnicos que trabalham em piscicultura. O objetivo é consolidar em uma única fonte de consulta o conhecimento disponível sobre nutrição de peixes com particular atenção às informações geradas e aplicáveis às condições brasileiras.
Qual a importância de criar uma Plataforma NutriAqua para o avanço da aquicultura no Brasil?
José Eurico – Considerando que nutrição pode representar até 70% do custo de produção em piscicultura, seja marinha ou interior, consolidar o conhecimento na área representará melhoria da viabilidade e lucratividade da agroindústria como um todo, criando um círculo virtuoso – geração de novos conhecimentos vai melhorar a qualidade das rações que vai melhorar a produtividade e a lucratividade dos sistemas, permitir mais investimentos em pesquisa e geração de novos conhecimentos.
Quais conhecimentos da Universidade de Auburn, nos Estados Unidos, você compartilhou no projeto NutriAqua?
José Eurico – A formação que um curso de doutoramento no exterior nos garante em termos técnicos não difere muito daquela garantida pela realização de um curso de doutoramento no país. Afinal, a literatura que dispomos para estudar é a mesma, aqui e “lá fora”. Eu vivo “brigando” para que os pesquisadores doutorados no país e os pós-graduandos brasileiros identifiquem-se com e orgulhem-se do título que têm ou terão – Doutor em Ciências, D.Sc. O grande diferencial de completar nosso treinamento no exterior é a “filosofia” da ciência que nos é incutida: produzir conhecimento de qualidade não vale coisa alguma se este conhecimento não for veiculado, “trazido à luz”, seja na forma de artigos científicos ou na forma de livros de consolidação do conhecimento, o instrumento mais efetivo de extensão continuada do conhecimento que existe.
Você que é professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo, acredita que com essa publicação os estudantes podem compreender melhor a aquicultura na prática?
José Eurico – Aquicultura é uma ciência multidisciplinar, ampla, quem sabe a mais abrangente das ciências agrárias que exista. Esta publicação é uma “ponta de iceberg”. Mas, sim, claro, vai contribuir para a melhoria do conhecimento e expandir a compreensão da área como um todo.
Como foi a contribuição da AQUABIO na elaboração do projeto NutriAqua?
José Eurico – Aquabio foi a catalizadora do projeto que resultou na publicação do livro. Sem a ação da Aquabio como aglutinadora das competências envolvidas na execução do projeto, o livro nunca existiria.
Qual foi o maior desafio, seu e da pesquisadora Débora Machado Fracalossi, na edição do livro “NUTRIAQUA – Nutrição e alimentação de espécies de interesse para a aquicultura brasileira”?
José Eurico – Todo trabalho envolvido numa publicação com esta característica é trabalho voluntário. O maior desafio foi estabelecer a rede de trabalho que envolveu pesquisadores de todas as regiões do país, vencer as distâncias geográficas, físicas. Por outro lado, nosso trabalho foi muito facilitado pela boa vontade, a paciência e a dedicação altruísta de todos os envolvidos.
Qual a colaboração do Ministério da Pesca e Aquicultura para as pesquisas?
José Eurico – Um projeto desta natureza é caro. O MPA financiou todo o projeto. Fica claro que sem a intervenção e apoio do MPA, o livro não teria sido produzido. Aliás, é preciso destacar que sem o apoio do Eric Routledge e do Rodrigo Roubach junto ao MPA este projeto não teria sido levado a termo. Bem, complementando o raciocínio, acho interessante comentar que recentemente o MPA lançou, via CNPq, um edital de fomento à pesquisa em aquicultura, e a área de nutrição está contemplada neste edital. As ações verticais e transversais do MPA têm sido muito eficazes, muito positivas, muito bem vindas, e os resultados começam a aparecer.
Qual é a importância de reunir 40 autores de diversos lugares e produzir uma obra com estudo em aquicultura?
José Eurico – Vencer as distâncias geográficas foi um desafio e tanto, mas todo o trabalho foi muito facilitado pela boa vontade, a paciência e a dedicação de todos os envolvidos. Resumindo: acho que o grupo como um todo mostrou que é possível sim executar projetos desta natureza, em “rede de trabalho”. Quem sabe esta seja a maior lição, o exemplo mais positivo da execução deste projeto.
O projeto “Plataforma NutriAqua” pretende começar novas pesquisas?
José Eurico – Difícil dizer. O projeto foi consolidado e o livro foi lançado apenas em novembro último. Vai ser necessário dar um pouco de tempo ao tempo para podermos avaliar os resultados e definir novas metas, novos projetos.
A parceria entre você e a professora Débora Machado Fracalossi ainda vai continuar para futuras publicações?
José Eurico – Bem, eu espero que sim. Tem um ditado dos países de língua inglesa que em tradução livre ficaria assim: os frutos não caem longe das árvores. Débora e eu completamos nosso doutoramento na mesma instituição, no mesmo laboratório e sob o mesmo orientador. Somos fruto da mesma árvore; compartilhamos não somente uma amizade fraterna, mas também uma identidade de propósitos e a mesma filosofia de trabalho. As demandas de nossas instituições, de nossos envolvimentos em administração acadêmica e de projetos de pesquisa locais são grandes; nossos envolvimentos extramurais também consomem muito do nosso esforço e disponibilidade de tempo. Existe ainda a distância geográfica (está certo que o deslocamento Piracicaba – Florianópolis hoje em dia consome pouco mais de duas horas…). Mas a mídia eletrônica – escrita, de voz e de imagem – tem nos ajudado muito. Quero deixar bem claro que este projeto foi pensado e liderado pela Débora; eu fui o colaborador, o fiel escudeiro. Projetos desta natureza são demorados, caros e demandam um esforço e dedicação incomuns; as limitações são realmente grandes. De qualquer forma, no tempo certo, sim, não haveria porque não estabelecer novas iniciativas em colaboração.