Durante o AQUACULTURE ’92 o Panorama da AQÜICULTURA entrevistou John Glude, proprietário da Langostinos del Caribe, uma bem sucedida fazenda de 64 ha de viveiros em Porto Rico e Harold Phillips, proprietário da Granja Costarricense de Camarones S.A., com 50 ha de viveiros na Costa Rica, ambas produtoras de Macrobrachium rosenbergii. Foi uma conversa informal onde John Glude falou entre outras coisas de seu desejo de criar uma espécie de associação internacional para melhorar a imagem do camarão de água doce nos principais mercados internacionais
Panorama – O Sr. esteve em 1986 no Brasil e pelo que viu, como avalia o potecial brasileiro para a aqüicultura?
John Glude – Na verdade aquela foi a segunda vez que estive lá. Eu já estive anteriormente em Pirassununga. Acredito que existe um tremendo potencial para a aqüicultura no Brasil. O clima é ideal e a abundância de água associada a terras relativamente baratas torna-o competitivo com o Equador. É um país grande e por isso mesmo a tecnologia deverá ser apropriada para cada região. . A Weyerhaeuser gastou US$ 8 milhões de 75 a 83 desenvolvendo uma pesquisa em Homestead na Flórida que seria aplicada no Brasil. A companhia tinha grandes projetos madeireiros no Brasil, mas planejavam criar Macrobrachium rosenbergii na mesma área. Montaram uma área piloto que durou apenas 6 meses. Foi um erro. O projeto foi instalado em águas onde a dureza era muito baixa, e os camarões não conseguiam fazer novas carapaças e como resultado tiveram que adicionar íons na água. Foi um erro do George Weyerhaeuser, que era o diretor senior da família. Descobriram que ficava muito caro. Mas a razão do projeto ter parado foi a recessão no mercado de construção nos EUA que diminuiu a demanda por madeira. Cortaram 30% de todos projetos de pesquisa e desenvolvimento. Fecharam as instalações de Homestead e desistiram da planta piloto no Brasil. O sistema desenvolvido pela Weyerhaeuser para o Brasil teria eventualmente funcionado, mas não funcionou para Porto Rico, onde temos uma situação muito diferente. Para Porto Rico por exemplo, custou-nos 3 anos e mais de US$ 1 milhão de dólares para pesquisar uma solução para o Macrobrachium rosenbergii. Temos uma alcalinidade e dureza acima de 300 mg/l e em nossos canais de irrigação encontramos mais de 100 mg/l. O principal problema lá é o pH alto. Modificamos o sistema para que funcionasse. Para cada lugar há de se adaptar, e modificar ao longo de várias safras a fim de se obter melhores resultados.
Panorama – E a indústria do Macrobrachium na Costa Rica? Harold Phillips – O mercado para o Macrobrachium na Costa Rica é muito bom. Nosso turismo tem se desenvolvido muito e a captura de camarões marinhos tem diminuido com o passar dos anos. Tradicionalmente a espécie nativa de Macrobrachium já era consumida, mas devido ao uso intensivo de inseticidas e herbicidas na agricultura, essas populações nativas tiveram uma redução dramática. Nossa demanda por Macrobrachium é forte e temos desenvolvido o marketing para o Macrobrachium rosenbergii a medida que nossa produção aumenta. Tudo que produzimos é vendido na Costa rica. Panorama – Qual a produtividade atual na Costa Rica? Harold Phillips – Em nosso projeto produzimos em média 2600 kg/ha/ano. Panorama – Além de Porto Rico e da Costa Rica quais os outros paises que produzem o M. rosenbergii na América Central? Harold Phillips – El Salvador, Guatemala e Honduras. Panorama – Dr. Glude, a indústria do Macrobrachium no Havaí acabou?
John Glude – Não. A Amorient produz bem e existem pelo menos uns 20 produtores com um, dois, cinco, dez hectares que estão fazendo bons negócios. O mercado lá é muito bom, melhor até que o nosso. Panorama – Quais os padrões de tamanho que normalmente são comercializados os Langostinos del Caribe? John Glude – Todos os tamanhos. O padrão 4 a 8 camarões por kg são os maiores e os mais caros mas representam somente 5% da nossa produção. A maior parte é do padrão 40 a 50 por kilo. Mas os EUA querem os grandes e de preferência a preços baixos (risos). Nossa preocupação não é essa e sim achar o número de restaurantes que comprem toda nossa produção. Panorama – E o produto final, como é vendido? John Glude – O produto final é vendido fresco ou congelado de maneira simples em sacos de 5 kg para os distribuidores ou supermercados. Para os camarões grandes, que são mais caros, um produto gourmet, há um preço gourmet e uma embalagem gourmet. Por falar nisso vocês tem uma colônia japonesa grande no Brasil, tradicionalmente os japoneses tem comido muito Macrobrachium. Ficam muito interessados no produto se ele é fresco. Embora o mercado internacional seja muito atraente, há um enorme mercado no Brasil. Os japoneses tendem a ser bem sucedidos economicamente de modo que podem pagar por alimentos de qualidade premium. Não recomendo que exclua o mercado internacional, mas talvez seja bom olhar melhor para o mercado interno brasileiro.
Panorama – Em Porto Rico vocês tiveram problemas de mercado relacionado com a textura da carne?
John Glude – Isto é um problema de manuseio. De como estão manuseando o produto. Não tem a haver com o produto em si. Resolvemos este problema com o controle da qualidade da carne desde o viveiro até chegar ao consumidor final e não foi uma tarefa simples. Além disso, para que ele seja bem preparado temos um chef em Porto Rico que está sempre à disposição para ensinar alguns pratos. Se for bem preparado não haverá jamais problema. A experiência prática nos mostrou que o produto só vende quando os restaurantes aprendem a cozinhar direito. Os clientes voltam sempre quando o prato é atraente. Tentamos explicar para os Chefs e quando eles se interessam funciona muito bem. Me diga, como é abatido o Macrobrachium no Brasil? Panorama – Normalmente os aqüicultores mais atentos abatem com choque térmico, na beira do viveiro, e daí direto para o mercado, quando não são congelados. John Glude – Os camarões após serem retirados do viveiro devem ser logo colocados em água com gelo por uns 30 minutos. Procuramos fazer com que a temperatura interna do camarão fique abaixo de 5 ºC. Depois, numa mesa, selecionamos por tamanho e colocamos logo de volta na água gelada. Quando são processados estão ainda fresquíssimos. Faz mais de um ano que não temos ouvido reclamações de nossos clientes sobre carne amolecida. Se isso ocorrer sabemos que houve problemas em nosso processamento. A despesca tem que ser minuciosamente controlada pois as vezes um cesto com camarões pode ser deixado por alguns minutos no talude enquanto novo arrasto é feito. Aí pode estar o início da deterioração pela ação das enzimas. Há muito erro humano, mesmo na área de beneficiamento. Se na hora do almoço um lote é deixado por uma hora em cima da mesa, haverá um início de deterioração. Os próprios restaurantes muitas vezes podem não mantê-los congelados convenientemente ou então podem deixá-los descongelando à temperatura ambiente aguardando o momento de ser preparado. Após pouco tempo as enzimas do hepatopâncreas agirão da mesma forma.
Panorama – E o mercado internacional?
John Glude – Há um sério problema com o M. rosenberggii que vem do sudeste asiático, principalmente para os EUA, que é na maioria das vezes de baixa qualidade devido a sujeira, bactérias ou outras contaminações. O reflexo disso ao longo do tempo, é que o preço médio do camarão de água doce no mercado internacional é hoje US$ 1,00 a menos por libra se comparado ao preço do camarão marinho. Principalmente devido ao baixo controle de qualidade do camarão do sudeste asiático é que gostaríamos de ver mais produtores produzindo camarões em fazendas de alta qualidade. Atualmente vê-se uma competição Leste-Oeste onde a produção de pescados do Sudeste Asiático é mais barata mas de pior qualidade. Os pescados tem gosto de lama e muitas outras disparidades ocorrem. O produto padronizado fornecido pela aquicultura, peixes livres do gosto de lama tem maior qualidade, uniformidade e aceitação. O produto precisa ser padronizado. Estou amadurecendo a idéia da formação de uma associação internacional de produtores de M. rosenbergii e talvez assim pudéssemos melhorar ainda mais a qualidade e o marketing de nosso produto e isso seria muito bom para todos. Quem sabe essa idéia venha a ser bem recebida pelos brasileiros?