Genética Abre Campo para Incremento na Produtividade Aqüícola

Por: Alexandre W. S. Hilsdorf
Prof. Adjunto da Universidade de Taubaté


A genética, que pode ser traduzida como “a relação entre a Hereditariedade e a Variância”, como ciência é uma atividade muito antiga que remonta dos primeiros homens que deram início a domesticação de animais e a agricultura. Estes, de forma empírica, aplicavam estes conhecimentos à seleção dos melhores exemplares para a obtenção da futuras gerações.

A genética clássica, que é a aplicação dos métodos de melhoramento, tais como: Seleção, Cruzamentos dirigidos e Hibridação, com a consequente análise dos dados obtidos, trouxe, a partir de meados da década de 40 grandes avanços para a agropecuária, fazendo com que houvesse um aumento significativo da produção de alimentos. Alguns exemplos marcantes são: o desenvolvimento do milho híbrido que elevou a produtividade de milho de 2.010 kg/ha na década de 30 para 6.290 kg/ha na década de 80, dos quais 58% deste ganho é devido ao melhoramento genético. Em termos de melhoramentos aplicados a animais, foi na avicultura que se alcançou grandes avanços. Em 1948 obtinha-se aves de 1.360 g aos 86 dias. Hoje, em apenas 49 dias, já se obtém animais de 1.814 g. Frangas poedeiras não melhoradas produzem em média de 60 a 80 ovos/ano, enquanto que aves melhoradas chegam a uma produção média de 270 ovos/ano.

Aplicação na Aqüicultura

Apesar da Aqüicultura ser uma atividade muito antiga, os métodos de melhoramento genético aplicados à outras atividades agropecuárias raramente são transferíveis ao cultivo de organismos aquáticos. Algumas razões para isto: 1. pouco controle sobre o ciclo reprodutivo e baixa sobrevivência das larvas de algumas espécies com potencial para o cultivo; 2. a falta de programas de cruzamento e seleção por parte dos próprios produtores que dão pouca atenção para o melhoramento de peixes e outros organismos aquáticos.

As Vantagens:

Apesar de ainda não ser muito usual a aplicação de técnicas de melhoramento genético em organismos aquáticos, estes podem dar uma resposta altamente significativa quando submetidos a programas de seleção.

Nos organismos aquáticos algumas características biológicas, influenciam e favorecem os métodos de melhoramento genético. Entre elas estão : a fertilização externa que facilita a manipulação dos gametas e permite uma melhor propagação artificial, manipulação cromossômica e aplicação de técnicas de engenharia genética; os sistemas de acasalamento não sincronizados que resultam numa descendência de irmãos e meio irmãos (como no caso das tilápias) e sincronizados onde muitos indivíduos participam de uma dada desova (e.g. carpas); a alta fecundidade que capacita uma seleção intensiva com um número reduzido de reprodutores e a possibilidade de hibridações inter-específicas.

É importante ter-se em mente a definição das características a serem submetidas ao processo de seleção. Estas devem mostrar variância genética e ter importância econômica. Cada característica deve ser bem definida para que se possa qualifica-la de forma precisa. Exemplos dessas características são: a Taxa de Crescimento, a Conversão Alimentar, a Sobrevivência, a Qualidade de Carcaça e a Fecundidade. Assim, são estudadas a herdabilidade, as correlações genéticas e fenotípicas, o efeito do meio ambiente e interação genótipo-meio ambiente de tais características.

As Técnicas

A maioria dos métodos clássicos de melhoramento genético compreendem técnicas de seleção como cruzamentos entre variedades da mesma espécie e hibridação entre espécies diferentes. Alguns tipos de seleção genética já aplicados ao melhoramento de organismos aquáticos são:

a) seleção massal – que é o mais simples e antigo método de melhoramento e consiste da seleção de indivíduos de acordo com o seu fenótipo (aparência exterior de fácil observação) como por exemplo, indivíduos maiores, mais resistentes a alguma doença etc…;

b) seleção de famílias – este tipo de seleção é usado quando o caractere que se pretende selecionar tem uma baixa herdabilidade como por exemplo: sobrevivência, qualidade de carne, idade de maturação e etc…Assim, a média fenotípica da família vem a ser a medida de sua média genotípica. Estas famílias são testadas e suas relativas performances tornam-se o critério para a sua seleção ou rejeição.

c) O cruzamento entre linhagens de indivíduos que apresentam valores fenotípicos diferentes é um método muito utilizado no melhoramento. Por exemplo, em uma revisão feita por Smitherman et alli (1983) sobre cruzamentos com Bagres de Canal (catfish), várias características, tais como: adiantamento da idade da primeira desova, aumento da taxa de crescimento e tolerância a doenças foram testadas.

d) A hibridação é outra ferramenta muito utilizada em aqüicultura. São feitos cruzamentos entre diferentes espécies de tilápias para a obtenção de uma descendência do mesmo sexo ou mesmo para a obtenção de híbridos de coloração diferente (tilápia vermelha).

O cruzamento entre carpa capim e carpa cabeça grande resultou em indivíduos triplóides e, desta forma, estéreis. Entre os Salmonídeos várias tentativas tem sido feitas no sentido de se obter melhores linhagens a partir de híbridações interespecíficas. Até agora o híbrido entre lake trout e brook trout, conhecido como splake tem sido o mais usado no cultivo de Salmonídeos. Nos países de clima mais quente como o Brasil, os métodos de hibridação juntamente como os processos de seleção podem resultar em linhagens mais resistentes ao nosso clima e ao mesmo tempo produtiva. A perspectiva do cultivo do Landlocked Salmon, o salmão de água doce, junto com a aplicação da genética abre caminhos para a obtenção de animais cada vez mais adaptados às nossas condições e que possuem alto valor de mercado.

Biotecnologia para Aqüicultura

Neste final de século, as tecnologias de ponta, como a Biotecnologia, vem se destacando enormemente. Entre os vegetais, as técnicas de cultura de tecidos, fusão de protoplastos e DNA recombinante, hoje já são amplamente utilizadas. Em alguns animais de criação, podemos encontrar hoje as técnicas de transferência de embriões, inseminação artificial e outras. Nos organismos aquáticos, ocorre uma maior facilidade do uso de metodologias vindas da Biotecnologia. Na manipulação de cromossomos, busca-se uma a obtenção de indivíduos poliplóides (3n ou 4n) que se mostram estéreis e consequentemente apresentam maior crescimento ginogênicos (somente com material genético da mãe). Individuos assim produzidos são utilizados em programas de gerações monosexada. Outra vantagem desta técnica é o rápido índice de monozigose obtido em pouco tempo. Hoje métodos de Engenharia Genética já vem sendo aplicados para se obter animais transgênicos, e na aquicultura são realizadas várias experiências para introduzir genes responsáveis pela fabricação de hormônios de crescimento (em outros animais) nos peixes, visando um incremento na taxa de crescimento desses animais. Outra linha de ação que já esta em testes visa a transferência de genes de peixes de águas árticas, resistentes ao frio, para outros peixes de maior interesse comercial transferindo a eles uma maior resistência a baixas temperaturas.

Podemos ver que a genética tem ampla aplicação dentro da aqüicultura e pode auxiliar de maneira significativa no aumento da produtividade de organismos aquáticos, bem como fornecer subsídios para uma análise do uso mais racional dos recursos genéticos marinhos e dulciaqüícolas de modo a contribuir para a conservação da variação genética existentes nestes ambientes.