Por:
João L. Campos, M. Sc.
Acqua Imagem Serviços em Aquicultura Ltda.
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O International Boston Seafood Show (IBSS) é a maior feira de pescados das Américas. Realizado em Boston, cidade do nordeste dos Estados Unidos, antes centro da atividade pesqueira do país, o evento ocorre anualmente no mês de março e congrega fornecedores de pescado de todo o mundo interessados em exibir e colocar seus produtos no mercado norte-americano. Além da feira, há sempre uma programação de palestras e conferências de assuntos relacionados ao tema. Tendo tido a oportunidade de novamente visitar a feira e participar das conferências este ano, apresento aos leitores da Panorama da AQÜICULTURA algumas impressões do evento.
Sustentabilidade
A sustentabilidade dos produtos está sendo cada vez mais valorizada por toda a cadeia de pescado. “Sustentabilidade” é a palavra-chave do momento, aparecendo com frequência nos folhetos e propagandas de pescado, com o mesmo peso de “qualidade” e “frescor”, e isso vale tanto para os produtos originários da pesca, quanto para os oriundos do cultivo. A maior consciência dos consumidores sobre o tema tem levado as redes de supermercado e produtores a buscar e desenvolver fontes comprovadamente sustentáveis e certificadas de pescado. Enquanto que provavelmente há gente que ainda é sustentável apenas no papel, a significativa presença de certificadoras (GlobalG.A.P., GAA – BAP, ASC, etc.), somada à grande quantidade de empresas sérias que estão certificando seus processos produtivos, e redes de supermercado que já exigem a certificação dos produtos que vão oferecer aos seus clientes, demonstram que a produção certificada realmente veio para ficar, e deve passar a representar uma parcela cada vez maior da produção pesqueira e aquícola.
Um ponto interessante é que apesar do consumidor se interessar cada vez mais sobre o pescado que consome, boa parte dos processos de certificação tem servido principalmente para garantir às redes de varejo que os produtos certificados são completamente rastreáveis, não possuem contaminações e são produzidos de acordo com as leis vigentes, sejam elas ambientais, trabalhistas, etc. Isto reduz drasticamente os riscos a que estas cadeias de supermercado estão expostas, e isso é a principal força que atualmente impulsiona os processos de certificação.
Peixes nativos oriundos da aquicultura
Ao contrário dos anos anteriores, no evento deste ano houve alguma presença de peixes cultivados nativos da América do Sul, tais como o pirarucu, pintado (surubim), tambaqui e tambacu, que se encontravam expostos em alguns estandes de produtores e distribuidores locais. O pirarucu, trazido pela empresa Amazone, do Peru, e também exposto por um distribuidor americano, sem dúvida era a espécie que despertava mais atenção dentre os nativos. Os peixes inteiros de aproximadamente 12 kg, expostos junto aos seus cortes atraíam considerável interesse, em especial no estande do distribuidor americano, onde eram distribuídas amostras preparadas para degustação. A empresa peruana declarou ter uma produção anual de cerca de 250 toneladas de pirarucu, comercializando seus produtos a US$ 16,00/kg de filé FOB.
Também despertaram o interesse na feira, o pintado (surubim) e os peixes redondos (tambacus anunciados como tambaqui), assim como seus cortes (filés, costela, etc.), oriundos de empresa brasileira, segundo o distribuidor americano que os estava expondo. Segundo ele, ainda não há preços definidos para estes produtos, uma vez que as negociações estão na fase inicial. No entanto, devido à atual taxa de câmbio, a expectativa desse distribuidor era de posicionar os produtos em uma faixa Premium, uma vez que seu valor, certamente, seria elevado em relação a outros produtos importados, como a tilápia. Suas expectativas iniciais são relativamente modestas, com apostas maiores no filé com pele do pintado e na costela de tambaqui.
As conversas com alguns expositores deixam claro que há avidez por novidades e procura por novas espécies. Obviamente, para atuar nestes mercados é necessário escala, regularidade de fornecimento e padrão de produto, além de toda a infraestrutura para exportar e garantir a qualidade do produto (frigorífico, SIF, APPCC, cadeia de frio, etc.). Atualmente, porém, pouquíssimas empresas que atuam com peixes nativos, cumprem estes requisitos, e essa é uma das razões que impede que os produtos da aquicultura brasileira tenham qualquer expressão no mercado internacional. Mas, nesta época em que a produção de tambaqui na Região Norte já está acima de 60.000 toneladas/ano e começa a saturar seus principais mercados, em especial a cidade de Manaus (AM), certamente seria interessante se os produtores locais conseguissem se estruturar de maneira a, ao menos, ter a opção de escoar seus produtos para o mercado externo.
Tilápia e Pangassius
A produção mundial de tilápia continua crescendo, apesar dos eventuais problemas com baixas temperaturas na China, o maior produtor mundial. Os preços têm demonstrado leve tendência de alta, face o aumento do custo dos insumos e da mão de obra na Ásia. A tilápia é uma das cinco principais espécies de pescado consumida nos Estados Unidos e é comercializada por muitas das empresas de pescado que atuam com produtos para o consumidor. A chave para este sucesso é a disponibilidade constante de filés de alta qualidade com bons preços, ofertada aos consumidores de inúmeras maneiras, facilitando o seu preparo pelo consumidor. Muitos produtos são semi-prontos, necessitando apenas serem aquecidos no forno.
Já o pangassius, produzido basicamente pelo Vietnã, também possui grande entrada no mercado americano, mas sua produção apresentou um declínio em 2012 e se espera nova redução este ano. A alta dos custos de produção e a crise mundial têm sido responsabilizadas pela redução dos números. Há uma percepção expressada por várias pessoas do ramo de que a conta do pangassius não está fechando e que as empresas integradoras (produção e processamento) apresentam dívidas crescentes. Além disso, no momento está sendo avaliada uma nova imposição de taxas de entrada sobre o pangassius nos Estados Unidos. Como o Vietnã não pode ser considerado exatamente como uma economia de mercado, as sobretaxas devem ser aplicadas com base no custo do pangassius produzido na Indonésia.
Participação de países na feira
Argentina, Chile, Peru, Equador e México, para ficar apenas na América Latina, vêm investindo na promoção da sua produção e empresas produtoras de pescado. A China era onipresente na feira, com grandes estandes do país e de várias de suas províncias. Estes países, além de vários outros, participaram da feira com estandes, abrindo oportunidades para suas empresas e produtos. Embora seja realidade que a base da produção de muitos dos países citados está na pesca e não na aquicultura, em quase todos se encontravam empresas apresentando produtos cultivados. Além da parcela da produção de pescado no Brasil (pesca + aquicultura) que atualmente teria condições de ser exportada e o número de empresas da área de aquicultura aptas para isso ser reduzido, a atual taxa de câmbio, bons preços no mercado interno e alto custo de produção no país acabam inviabilizando o mercado externo na maioria dos casos. Desta forma, a participação do Brasil na feira ficou limitada ao estande da empresa Leardini e aos empresários do setor que a visitaram.
Camarão
Uma preocupação corrente na feira era o impacto da EMS (Early Mortality Syndrome – síndrome da mortalidade precoce, em tradução livre), doença do camarão que este ano deve reduzir a produção da Tailândia em pelo menos 30%. Os preços já têm forte viés de alta e muitos importadores mencionam que se encontram com dificuldade de abastecimento para o segundo semestre do ano.
Um outro assunto relacionado ao camarão é a possibilidade de novas sanções comerciais dos Estados Unidos em relação a vários países produtores (o Brasil não deve ser afetado desta vez, aparentemente), decorrente novamente da pressão dos pescadores da região do Golfo, no sul dos EUA.
Preços de pescado
Há uma percepção geral no mercado de que os preços do pescado, em geral, devem subir nos próximos anos. Os aumentos dos custos de produção e dos esforços de pesca estão pressionando neste sentido tanto a aquicultura quanto a pesca. A alta de preço verificada nas outras fontes de proteína e a demanda crescente por pescados também contribui neste sentido. Há uma expectativa de que os preços de pescado nos Estados Unidos subam ao longo deste ano e se mantenham em patamares elevados, sem previsão de baixa.
Próximo evento
A edição desse ano do maior evento da indústria de frutos do mar da América do Norte reuniu mais de 19 mil participantes, tendo sido, segundo os organizadores do evento, o maior em seus mais de 30 anos de história. A feira no Boston Convention and Exhibition Center, contou com 1017 empresas expositoras representando 46 países.
No próximo ano a feira já está agendada para ser realizada entre os dias 16 a 18 de março sob seu novo nome Seafood Expo América do Norte e Seafood Processamento América do Norte. Mais informações já estão disponíveis no site seafoodsource.com