Autora: Lia Ferraz de Arruda
Bolsista CNPq – ESALQ/USP
Peixes tão frescos, brilhantes e firmes como recém tirados da água, mas a muitos quilômetros de distância do mar ou de tanques de piscicultura e muito tempo após a captura. Como pode ser possível? Graças à pasteurização por irradiação, submetendo-os a reduzidas doses de radiação nuclear. A conservação de alimentos por irradiação é uma das aplicações verdadeiramente pacíficas da energia atômica e, é um método tão seguro que é recomendado sem nenhuma restrição pela OMS (Organização Mundial de Saúde) e pela FAO (Organização Agrícola de Alimentação das Nações Unidas).
Peixes tão frescos, brilhantes e firmes como recém tirados da água, mas a muitos quilômetros de distância do mar ou de tanques de piscicultura e muito tempo após a captura. Como pode ser possível?
Graças à pasteurização por irradiação, submetendo-os a reduzidas doses de radiação nuclear.
Infelizmente, quando se fala em energia nuclear, a população, de um modo geral, não só a brasileira, mas do mundo todo, pensa em acidentes radioativos, na bomba atômica no Japão ou a suposta bomba atômica construída por Sadam Hussein no Iraque.
A conservação de alimentos por irradiação é uma das aplicações verdadeiramente pacíficas da energia atômica e, é um método tão seguro que é recomendado sem nenhuma restrição pela OMS (Organização Mundial de Saúde) e pela FAO (Organização Agrícola de Alimentação das Nações Unidas).
A atenção dos consumidores está voltada para os alimentos de conveniência (inclusive atributos de embalagem e distribuição); os atributos nutricionais; “shelf life” (tempo de prateleira) e a segurança alimentar. Para atender essas exigências a agroindústria brasileira tem evoluído assimilando os avanços conseguidos em sistemas agroindustriais mais desenvolvidos, via compra de patentes por empresas nacionais ou na associação de empresas via “joint venture”.
A irradiação é um revolucionário método de “pasteurização fria”, com a vantagem de proporcionar aos alimentos uma durabilidade muitas vezes maior do que os métodos tradicionais de pasteurização. Além disso, essa tecnologia não altera fisicamente a aparência, forma, ou temperatura dos alimentos, produzindo alterações químicas insignificantes e imperceptíveis ao paladar do consumidor. Outra vantagem é a grande variedade de produtos que podem ser submetidos a esse processo: grãos, farinhas, tubérculos, frutas, pescados, frango e carnes bovina e suína.
Raios Gama
O processo de irradiação é relativamente simples e os alimentos não tem contato direto com os raios gama. Os produtos, embalados ou a granel, em geral são deslocados através de esteiras, sendo submetidos a um campo de irradiação em um ritmo controlado e preciso. Os níveis de energia são baixos e, portanto, incapazes de induzir radioatividade nos produtos. Operadores qualificados monitoram o tratamento através de um console situado fora da câmara de irradiação, construída com paredes de concreto e portas de chumbo, projetadas para impedir a liberação da radiação. Dispositivos de intertratamento e alarme impedem que a fonte de radiação se eleve no caso de as portas não estarem lacradas.
Centro de Energia Nuclear na Agricultura
O Centro de Energia Nuclear na Agricultura (CENA), localizado em Piracicaba – SP, realiza desde a década de 50, pesquisas no campo da irradiação de alimentos. Em 1995, implantou vários projetos, obtendo bons resultados ao combinar métodos de irradiação e de refrigeração para aumentar a vida de prateleira de mangas e bananas.
A irradiação no CENA vive uma fase promissora diante da instalação, em 1999, de um novo reator. A irradiação de alimentos foi aprovada no Brasil pelo Decreto 7218/1973 do Ministério da Saúde. A Norma de Irradiação de Alimentos foi aprovada pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) na resolução 05/1980. A portaria DINAL (Divisão Nacional de Vigilância Sanitária de Alimentos) número 9, de 8 de março 1985 regulamentou o assunto, fato publicado no Diário Oficial da Nação em 13 de março de 1985.
A verdade é que as indústrias ainda não se aproveitam do potencial da irradiação, sendo necessário um maior intercâmbio entre o meio acadêmico e o meio industrial para que essa tecnologia seja difundida com apelo comercial. Mas à medida que é feita uma conscientização do consumidor, quando ele comprova melhor qualidade nos produtos irradiados em detrimento dos não irradiados, sua reação é sempre favorável. Nos últimos dez anos, muitos países têm comercializado alimentos irradiados como maçãs, batatas, cebolas, mangas, pescados e salsichas fermentadas de carne suína, todos obrigatoriamente etiquetados como “alimento irradiado” e, as respostas dos consumidores e produtores têm sido positivas.
O Brasil tem um perfil ideal para a implantação do método de irradiação de alimentos, por ser um país de dimensões continentais. Além de aumentar a vida útil dos produtos a custo baixo, o que, obviamente, reduz os desperdícios causados por amadurecimento ou apodrecimento, o método de irradiação pode eliminar algumas etapas na distribuição dos alimentos, reduzindo significativamente o custo final dos mesmos.
Qualidade
Fator interessante é a associação da técnica de irradiação à agroindústria comercializadora de produtos de pescado.
A produção de pescado no Brasil vem crescendo sob o influxo da expansão da piscicultura de água doce favorecido pelo grande potencial de águas interiores no Brasil. Podemos até pensar no pescado não só como fonte alimentar de excelente qualidade do ponto de vista nutricional, mas também como fonte de divisas para o país através da exportação.
O peixe é alimento de altíssimo valor nutritivo, saudável e não tem repercussão nociva sobre o colesterol. O que falta é estimular o hábito do brasileiro de se alimentar de peixe. Para isso, temos que oferecer ao consumidor três condições: qualidade, preço acessível e abastecimento regular e contínuo e, para isso, é necessário reduzir as perdas de pós-colheita, que chegam a 40% desde a captura até a comercialização.
Apesar de muito nutritivo, o pescado é a carne que mais rapidamente se deteriora, razão pela qual é necessário preservá-la em condições de higiene e em baixas temperaturas para que a mesma mantenha sua ótima qualidade, quer sensorial, quer microbiológica. Portanto, para podermos oferecer ao consumidor um alimento nutritivo como o pescado, devemos primeiramente mantê-lo em boa qualidade tanto sanitária quanto sensorial e a irradiação, associada à técnica da refrigeração, contempla essas características.
O uso da irradiação permite que se obtenha o pescado minimamente processado, aumentando a vida de prateleira do produto refrigerado, o que se constitui em um meio do consumidor encontrar o alimento no estado de “fresco”, sem necessariamente sofrer processos tecnológicos radicais, a não ser a filetagem e o corte em postas.
A utilização da irradiação em baixas dosagens, cerca de 3KGy, permite a descontaminação de doenças (inclusive doenças como o cólera) e o aumento na vida de prateleira do pescado para cerca de trinta dias sob refrigeração, dispensando o congelamento.
A irradiação é uma alternativa tecnológica viável para o pescado, pois além de conferir sanidade, importante em um alimento dos mais perecíveis, não produz perdas nutricionais significativas em um alimento excelente na quantidade e qualidade dos nutrientes.