O Cultivo do Bijupirá em Taiwan

A escolha de um peixe de carne branca para consumidores exigentes

Por: David Chang Diretor do
Overseas Fisheries Development Council
e-mail: [email protected]


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O cultivo do bijupirá, um peixe também nativo das águas brasileiras, já atrai investidores brasileiros pelo seu alto valor no mercado internacional e pelo seu excelente potencial de crescimento, duas vezes maior que o do salmão. Nada mais oportuno, portanto, que conhecer alguns aspectos do bem sucedido cultivo deste peixe em Taiwan, país onde está presente em 80% dos cultivos marinhos em tanques-rede. O presente artigo foi publicado originalmente na Infofish International, uma das revistas internacionais que mantém com a Panorama da AQÜICULTURA um acordo visando a troca de informações de interesse do seus leitores.

Para mais informações em Taiwan: 1 – Penghu Cobia Farmers Co-operation – tel: 886-6-9265011 e fax: 886-6-9264958 2 – Pan Asia Ocean Corp, e-mail: [email protected] website: www.paosf.com.tw 3 – Everspring Marine Development – e-mail: [email protected] website: www.seafarm.com.tw 4 – Cultivos em gaiolas em Taiwan: www.toaa.org

A aqüicultura em Taiwan desenvolveu-se rapidamente durante as últimas três décadas, fruto da combinação de esforços dos setores público e privado. As pesquisas, principalmente aquelas voltadas para o desenvolvimento das técnicas de propagação artificial e engorda, permitem que hoje existam cerca de 100 espécies aquáticas sendo cultivadas no país. Não existem dúvidas sobre o importante e crescente papel que a aqüicultura taiwanesa tem desempenhado no fornecimento de alimentos e na criação de novos postos de trabalho. Em 2002, a produção aqüícola do país foi de 346.991 toneladas, avaliadas em R$ 230 milhões. Este volume, representou 25% do total do total de pescados produzidos, e 32% do valor total dessa produção.

Taiwan tem uma costa com cerca de 1.600 km onde podem ser encontrados mais de 30.000 hectares de áreas protegidas e desprotegidas, com menos de 30 m de profundidade, o que proporciona excelentes condições para a implantação de cultivos utilizando os tanques-rede (ou gaiolas). Para aliviar os impactos dos cultivos realizados em viveiros escavados, a política de desenvolvimento da aqüicultura em Taiwan tem sido estruturada de forma a ser menos dependente da água e dos recursos terrestres, o que tornou o desenvolvimento dos cultivos marinhos uma das opções mais apropriadas. Desta forma, sob a orientação do governo e utilizando tecnologia estrangeira para a construção de tanques-rede, os investimentos em cultivo expandiram-se gradualmente para as áreas oceânicas. Atualmente, mesmo após anos de desenvolvimento, a área ocupada pelos cultivos marinhos é ainda pequena, representando somente 0,08% da área total ocupada pela indústria aqüícola. Mesmo assim, é responsável por 9% de toda a produção e 14% do faturamento do setor. A experiência tem mostrado que o bijupirá (ou cobia, como é conhecido na língua inglesa) é a espécie ideal para os cultivo marinhos em gaiolas, e tem revelado o seu grande potencial para transformar-se num pescado popular.

Características do bijupirá cultivado

O bijupirá (Rachycentron canadum) é um peixe pelágico migrador de grande porte, encontrado em águas tropicais e sub-tropicais, e com menor freqüência em águas temperadas, incluindo as áreas costeiras e abrigadas de Taiwan. A faixa de temperatura ótima para o bijupirá vai de 22 a 32 °C e, segundo alguns dados, a atividade alimentar reduz-se ou mesmo cessa à medida que a temperatura cai. O bijupirá é um peixe delicioso de carne branca cuja captura limitada, não ultrapassa 10.000 toneladas anuais em todo mundo. Por ser um peixe sem bexiga natatória, o bijupirá necessita nadar o tempo todo. Esse seu incansável hábito faz com que a qualidade do bijupirá cultivado seja tão boa quanto a do capturado na natureza, e o maior conteúdo de gordura do peixe cultivado (tabela 1) o torna ainda mais delicioso que os peixes selvagens.

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O crescimento do bijupirá é muito rápido, sendo essa a característica que mais atrai quem o cultiva. O peixe pode alcançar de 6 a 8 kg em um ano, em condições ambientais adequadas, o que representa uma taxa de crescimento pelo menos duas vezes maior que a observada no cultivo do salmão. A carne do bijupirá não é somente rica em proteínas, possuindo também elevadas taxas de ácidos graxos insaturados como o EPA e DHA, além de outras substâncias nutricionais incluindo a vitamina E, taurina e ornitina (tabela 2).

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Cerca de 55 a 60% do peixe é comestível e as variações na umidade e na quantidade de gordura fazem com que a textura, a aparência e o sabor da carne variem nos seus diversos cortes. O peixe permite que os consumidores o preparem de todas as formas que desejarem. Entretanto, devido ao teor de gordura e frescor, as melhores formas de preparar o bijupirá são o: sashimi, sushi, assado, e defumado a frio ou quente. Não há mais dúvidas de que o bijupirá é um excelente peixe para sashimi, pois sua carne possui textura macia e firme como a do amberjack (Seriola spp.), um peixe muito apreciado pelos japoneses.

Condições gerais para o cultivo do bijupirá em gaiolas em Taiwan

O Japão tentou criar o bijupirá em tanques-rede marinhos, mas o sucesso foi limitado devido às condições climáticas e, desde então, a criação do bijupirá no Japão é pequena. Segundo os especialistas e as experiências obtidas pelos criadores, a região mais apropriada para a criação do bijupirá deve ter uma temperatura que varie de 23 a 30 °C, o que torna Taiwan, bem como outros países localizados em regiões tropicais e sub tropicais, muito adequados ao desenvolvimento do cultivo em gaiolas desse peixe.

Além de áreas com temperaturas superficiais adequadas, as águas limpas e não poluídas são fundamentais para a criação de bijupirá de alta qualidade. Em Taiwan, os litorais de Penghu e Pingtung possuem águas de excelente qualidade, ideais para o cultivo do bijupirá e está provado que a qualidade do bijupirá engordado em áreas oceânicas é maior que a daqueles criados em áreas costeiras ou abrigadas. Tecnologias avançadas e equipamentos de cultivo apropriados farão com que, em breve, os bijupirás criados em Taiwan tenham preços mais competitivos que os encontrados nas províncias do sul da China e no Vietnã, onde são produzidos através de métodos tradicionais, seja em viveiros ou em cultivo marinhos nas áreas costeiras.

O desenvolvimento

O bijupirá não é a primeira espécie cultivada em Taiwan em gaiolas no mar. Antes dele, o red snapper (Lutjanus spp.) e o amberjack (Seriola spp.) foram as principais espécies cultivadas na zona costeira e nas áreas protegidas. Na verdade, o início dos cultivos marinhos na área costeira em Taiwan remonta aos anos 60, e no final da década de 80 os pesquisadores casualmente descobriram que o bijupirá tinha uma alta taxa de crescimento e que havia um mercado potencial no Japão e no próprio país. A experiência de mais de vinte anos em aqüicultura e a disponibilidade de alevinos, fizeram com que os produtores se decidissem por desenvolver os cultivos do bijupirá em gaiolas nas áreas offshore, utilizando tecnologias norueguesas. Os produtores do município de Penghu, uma ilha na costa de Taiwan, foram os primeiros a iniciarem o cultivo do bijupirá em tanques-rede. Posteriormente, percebeu-se que as condições climáticas e as correntes marinhas em Taiwan eram bem diferentes daquelas encontradas na Noruega. Assim, através de experimentos e testes realizados pelos produtores e especialistas taiwaneses, foi possível conceber e aperfeiçoar redes submersíveis capazes de afundar até 10 metros durante um tufão. Atualmente, existem mais de l500 gaiolas marinhas cultivando bijupirás em Taiwan, a maioria delas localizadas nos municípios de Penghu e Pingtung.

Além da introdução de gaiolas submersíveis, outras melhorias no cultivo foram introduzidas pelos produtores locais, entre elas o cultivo em duas fases, a transferência de alevinos para as gaiolas de engorda e, a melhoria da ração e dos equipamentos de alimentação automática. A combinação desses esforços foi o que permitiu o desenvolvimento do cultivo do bijupirá em gaiolas existentes hoje em Taiwan. A produção cresceu dramaticamente desde as 750 toneladas produzidas em 1997 até as 3.710 toneladas em 2001 (tabela 3) e hoje, Taiwan tem um potencial para produzir mais de 10.000 toneladas de bijupirá por ano. O estímulo veio, principalmente, a partir da primeira exportação realizada em 1999, onde 450 toneladas foram comercializadas com sucesso para o Japão, fazendo com que, daí em diante, muitos produtores se voltassem para o cultivo do bijupirá.

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Organização

A promoção e encorajamento das autoridades pesqueiras de Taiwan, seguida do êxito das conquistas dos mercados externos, acrescido dos ótimos resultados no mercado doméstico, motivaram muitas empresas no envolvimento da produção, processamento e comércio das espécies marinhas cultivadas em gaiolas. Assim, para promover o desenvolvimento e melhorar a tecnologia dos cultivos marinhos em gaiolas, foi criada em 1999, a Associação Taiwanesa da Aqüicultura Offshore, composta por grupos e por indivíduos envolvidos com indústrias. Entre os membros estão os principais produtores de bijupirá e outras espécies marinhas, como a Penghu Cobia Farmers Co-operation, Pan-Asia Ocean Corp e a Everspring Marine Development. A tarefa da associação é promover a tecnologia dos cultivos marinhos em gaiolas e estabelecer uma indústria de cultivo de bijupirá bem desenvolvida, bem como também de outras espécies de alto valor comercial.

Visão geral

Além de um ambiente oceânico limpo e uma grande variedade de recursos, Taiwan tem diversas vantagens no que se refere ao desenvolvimento de cultivos marinhos do bijupirá, com destaque para os mais de 30 anos de experiência em aqüicultura, que acabou por gerar uma mão-de-obra de qualidade e um avançado know-how sobre o cultivo de bijupirá. Além disso, a disponibilidade de fundos e infra-estrutura adequada de apoio à indústria aqüícola, são fatores que têm direcionado o desenvolvimento e o êxito do cultivo desse peixe em Taiwan. Entre outros importantes fatores está também a proximidade geográfica do Japão, principal mercado consumidor, e uma bem-sucedida expansão do mercado doméstico.
Depois de anos de pesquisa e desenvolvimento, já se conhece bastante a biologia do bijupirá, da mesma forma que já existe um adequado conhecimento tecnológico nas fazendas, o que faz com que o bijupirá hoje esteja no topo da lista de prioridades no cultivo de espécies marinhas a ser desenvolvida em Taiwan. Em resumo, é possível dizer que o cultivo marinho de bijupirá em Taiwan tem seguintes vantagens:
• O cultivado em Taiwan utiliza uma espécie local, o que acarreta um impacto mínimo nos estoques naturais.
• O cultivo oceânico ajuda a reduzir a pressão no uso da terra bem com a pressão sobre os estoques naturais.
• O bijupirá é uma espécie de carne branca, portanto não há necessidade de adicionar aditivos na sua ração para alterar sua coloração.
• Tecnologias avançadas desenvolvidas para camarões, enguias, etc.., dão apoio a habilidade dos fazendeiros e os ajudam a suplantar rapidamente os novos desafios encontrados na indústria do bijupirá
• A experiência acumulada em décadas de captura pesqueira permite que os produtores de bijupirá facilmente suplantem os desafios das operações no mar necessárias à aqüicultura marinha.
• Como um dos maiores países exportadores do mundo Taiwan tem o necessário sistema de transporte para entrega aérea ou marítima de bens, incluindo pescados, para todos oas maiores cidades do mundo.
• O país possui indústrias preparadas para prover a indústria aqüícola com todas as tecnologias e equipamentos, com destaque para a tecnologia de construção submarina, construção de redes e rações de boa qualidade, etc.

 

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Sendo uma espécie de peixe de carne branca, de rápido crescimento, o bijupirá tem um grande potencial para suplementar o mercado, na falta de outras espécies populares de carne branca, como o peixe de areia do Alasca, ou mesmo bacalhau cujos estoques estão declinando rapidamente devido a sobre pesca. Nessas circunstâncias o cultivo do bijupirá será uma ótima opção para consumidores de peixe de carne branca e, certamente, Taiwan será um dos maiores fornecedores.

Conclusão

O sucesso do desenvolvimento de qualquer espécie depende da disponibilidade de tecnologia e da viabilidade do negócio em termos de custos, apoio da comunidade local, reconhecimento do produto por parte do consumidor, sua qualidade, preço e disponibilidade. A textura da carne dos peixes médios/grandes é diferente dos peixes pequenos, assim como o seu preparo, que também difere de mercado para mercado. Existem sinais óbvios de declínio dos estoques de um grande número de espécies de peixes marinhos, notadamente os de médio e grande porte como o atum, marlin e outros. Há uma grande demanda por essas espécies e, por isso, há a necessidade de encontrar alternativas, o que torna o cultivo desses peixes uma meta que o setor aqüícola precisa alcançar, apesar de envolver grandes desafios, entre eles a disponibilidade de instalações, alevinos, tecnologia, alimento, manejo, controle de doença, etc. Alguns dos componentes chaves do processo produtivo de peixes marinhos ainda não estão bem desenvolvidos e, numa luta contra o tempo, pesquisas têm sido realizadas por instituições públicas e privadas.

O salmão parece ser a única espécie cuja tecnologia de cultivo cresceu significativamente tornando-se uma importante indústria no mundo. Já o cultivo de atum (bluefin tuna) envolve apenas a alimentação de juvenis capturados até que alcancem o tamanho de mercado. Apesar de já termos visto reportado que a propagação artificial do atum já foi realizada com êxito, a sua efetivação como prática comercial levará ainda algum tempo.

O que temos visto e que o consumo mundial de pescados tem aumentado em decorrência do crescimento da população mundial e das mudanças dos padrões de consumo de alimentos, decorrentes de uma maior conscientização dos benefícios para a saúde. Devido a sobrepesca, a produção pesqueira vem declinando, ao mesmo tempo que observamos o crescimento da produção da aqüicultura em conseqüência dos avanços da tecnologia e dos grandes investimentos da indústria. Segundo relatórios da FAO, a proporção dos produtos da aqüicultura na produção total de pescados será de 40% em 2010, sendo atualmente 29%.

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Por ter um rápido crescimento e por ser uma espécie de carne branca, o Bijupirá tem um grande potencial para suplementar o mercado na falta de outras espécies como o peixe de areia do Alasca ou o Bacalhau. Nessas circunstâncias Taiwan será, certamente, um dos maiores fornecedores de Bijupirá cultuvado.

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