O Gênero Brycon

Piracanjuba, matrinchã, piraputanga e piabanha, entre outros

Por José Oswaldo Junqueira Mendonça
Eng. Agrônomo do Centro de Pesquisa
e Treinamento em Aqüicultura – CEPTA/IBAMA


Os peixes do gênero Brycon se dis-tribuem pelas principais bacias hidrográficas brasileiras.

Os peixes do gênero Brycon, tem sido recentemente incorporados com maior intensidade nas criações experimentais e mesmo comerciais. São espécies de grande valor comercial que se distribuem pelas principais bacias hidrográficas brasileiras.

Na região Amazônica ocorre o matrinchã Brycon cephalus, na bacia do Paraná-Uruguai a piracanjuba Brycon orbignyanus, na do São Francisco o matrinchã Brycon lundii, no Pantanal-Paraguai a piraputanga Brycon s.p. e, na bacia do Leste a piabanha Brycon insignis.

Desta forma, em cada região brasileira encontramos uma espécie importante deste gênero, podendo cada região criar a sua espécie, não havendo necessidade de translocamentos, fator de risco para a biodiversidade de cada região, aliado ao lado positivo de que cada espécie está evolutiva e geneticamente adaptada à sua bacia de origem, principalmente aos fatores climáticos, que refletirão no desempenho zootécnico da criação.

No ambiente natural, alimentam-se preferencialmente de frutos e sementes. Por isso, em algumas regiões brasileiras, o desmatamento ciliar, os barramentos dos rios e a poluição industrial, são considerados os principais fatores responsáveis pelo desaparecimento dos Brycon, como a quase extinção da piracanjuba na região Sudeste, e da piabanha no Rio Paraíba do Sul.

As duas espécies, mais estudadas são o matrinchã e a piracanjuba, que apresentam comportamento muito semelhante em cativeiro. As informações apresentadas a seguir são oriundas de trabalhos realizados com ambas as espécies, que de forma geral não devem diferir muito dos outros Brycon.

REPRODUÇÃO

Peixes migradores no ambiente natural, em cativeiro apresentam maturação gonadal aos três anos de idade. Para a reprodução induzida, aplica-se os mesmos procedimentos adotados para as demais espécies reofílicas, que consiste na observação do volume abdominal das fêmeas, flacidez da região ventral e papila urogenital hiperemiada, podendo ser realizada canulação ou punção ovariana, e para os machos a fluidez do sêmen sob leve pressão. Os melhores resultados são obtidos com aplicação intraperitonial de extrato hipofisário, com dosagem de 5 mg/kg para fêmeas, divididos em duas doses, 0,5 e 5,0 mg/kg, a intervalo de 12 horas. A dose única para machos é de 1,0 mg/kg, simultânea a segunda dose das fêmeas. A desova ocorre por volta de 170 horas-grau, obtendo-se cerca de 10% de óvulos em relação ao peso vivo da fêmea. Os ovos são incubados em incubadoras tipo húngara, e a eclosão das larvas ocorre por volta de 440 horas-grau.

LARVICULTURA E ALEVINAGEM

A fase larval dos Brycon, consiste na principal limitante tecnológica para sua criação, pois cerca de 35-36 horas após a eclosão, as larvas iniciam o canibalismo. Nadam no sentido vertical, com a bexiga natatória apresentando apenas 50% de sua capacidade insuflada e, se transferidas nesta ocasião para os viveiros, resultará em baixa sobrevivência. A técnica mais eficaz atualmente adotada é a de fornecer larvas de outras espécies (pacu, piau, curimbatá), em quantidade cinco vezes superior às larvas de Brycon, e mantê-las por mais dois dias nas incubadoras, quando encontram-se bem desenvolvidas, com movimento de natação horizontal podendo ser soltas nos viveiros de alevinagem. Apesar do rápido crescimento que os Brycon apresentam, a oferta de larvas de outras espécies encarece sobremaneira o custo de produção destes peixes. Os alevinos, com 20 dias de idade, alcançam comprimento em torno de 4-5 cm, e peso de 4 g, com sobrevivência na fase de larva a alevino superior a 20%.

ENGORDA

Os Brycon têm evidenciado um modelo biológico adaptável à piscicultura em regime intensivo com um grande potencial de crescimento, podendo inclusive atingir 300 g de peso em 4-5 meses de vida. A densidade de estocagem usual é de 1 peixe/m², embora estudos demonstraram que com 3 peixes/m², o crescimento não foi prejudicado, até atingir peso médio de 400g, com 150 dias de criação (HONCZARYK, INPA, Manaus). O principal fator limitante foi a qualidade de água, tendo aparentemente o viveiro atingido sua capacidade limite, o que poderá ser contornado com fluxo de água e/ou aeração no viveiro, mas estes aspectos devem, ainda, serem melhor estudados.

Aceitam muito bem rações peletizadas ou extrusadas, que poderão ser balanceadas com ingredientes de origem vegetal. Em condições experimentais, o farelo de soja tostado substituiu totalmente a farinha de peixe como fonte protéica, sem comprometer o crescimento dos peixes. Rações com 25% de proteína bruta parecem atender às exigências do matrinchã tanto na fase inicial como na de engorda.

A ração pode ser fornecida à lanço, e os Brycon tem o hábito de pegá-la na superfície, não havendo necessidade de fixar taxa de alimentação em relação à biomassa, pois os peixes mostram o quanto consomem no dia. Criados em viveiros bem manejados podem apresentar conversão alimentar inferior a 1,5:1. O peso, ao final de um ano de idade, pode alcançar de 800 g a 1,0 kg, apresentando-se o lote muito homogêneo, dispensando despesca parcial ou seletiva.

Até o momento não se registrou ocorrência de mortalidades ocasionadas por parasitos ou doenças, embora já tenha-se verificado infestação de Lernea em matrinchã. Assim, recomenda-se aos piscicultores interessados a adquirir alevinos, que certifiquem-se da procedência.

COMERCIALIZAÇÃO

Não podemos dizer agora com que peso os Brycon devam ser comercializados, mas exemplares de matrinchã analisados, com pesos vivos variando de 280 a 700 g, proporcionaram rendimento de 50% de filé com pele, evidenciando que este peixe tem rendimento de parte comestível acima de muitos peixes cultivados.
Em comercialização experimental realizada em 1994, com exemplares pesando em média 700 g, 96,7% dos consumidores consideraram o matrinchã de sabor excelente e bom; 58% opinaram ser de peso bom ou suficiente; 42% consideraram pequeno e 100% manifestaram intenção de nova compra; 64,5% na freqüência de uma vez por semana. Estes dados mostram que havendo oferta regular com o produto de boa qualidade e preço justo, o matrinchã, como possivelmente todos os outros Brycon, não terá grandes problemas de mercado.

Filés de peixes da mesma espécie, alimentados com diferentes fontes protéicas – animal (farinha de peixe) e vegetal (farelo de soja tostado) e submetidos a análise química, apresentaram resultados similares: alta proteína (19,0%) e baixo lipídeo (4,5%) incluindo este peixe na classe A de Stanby -1962.

Em 1996, alguns produtores iniciaram engorda de Brycon, tanto de matrinchã como de piraputanga, principalmente visando atender aos pesque-pagues, uma vez que estes peixes apresentam performance altamente esportiva, e sem dúvida, terão alta demanda neste segmento de mercado. Oferta de alevinos também já ocorrem neste mesmo ano por parte da iniciativa privada.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Embora alguns estudos tenham sido realizados já nos anos 70, somente a partir de 1992 é que as pesquisas com Brycon foram intensificadas, por várias instituições de pesquisa e Universidades. Assim, em 1994, foi realizado o “Seminário sobre Criação de Espécies do Gênero Brycon” no CEPTA/IBAMA em Pirassununga-SP, no sentido de integrar instituições e pesquisadores, a fim de que fossem estabelecidas diretrizes de pesquisa e ações conjuntas, visando não somente aspectos ligados a geração de tecnologias, mas também de preservação destas espécies.

Uma segunda reunião foi realizada em 1995 na CEMIG, Volta Grande-MG com os mesmos objetivos. Foram elaboradas propostas de estudo nas áreas de reprodução, genética de peixes, larvicultura e alevinagem, manejo, nutrição e tecnologia pós-colheita, com definição de participantes em cada segmento, no sentido de evitar-se o paralelismo de pesquisa.