A necessidade de fornecer proteína animal a uma população crescente implica na diminuição dos impactos ambientais da produção através de inovações que aumentam a sustentabilidade, qualidade e valor nutricional de peixes e camarões. Na produção animal, a alimentação pode ser responsável por 50-80% da pegada ambiental, diretamente relacionada com a rentabilidade e sustentabilidade dos cultivos, e desempenha um papel crítico na produção de animais saudáveis e de alta qualidade com valor nutricional para o consumo humano.
Como elemento chave do pilar econômico da sustentabilidade, a rentabilidade da aquicultura depende, por sua vez, de um bom desempenho em termos de crescimento e sobrevivência de peixes e camarões.
No contexto da sustentabilidade e rentabilidade, a aquacultura enfrenta desafios como:
1. Restrição do uso de antibióticos devido a preocupações sobre o aumento da resistência bacteriana: O uso de antibióticos por seres humanos e animais tem estado sob grande escrutínio. Portanto, estão em curso contramedidas para introduzir programas alternativos de gestão sanitária – incluindo estratégias nutricionais e dietas funcionais.
2. A pressão para reduzir o nível de farinha de peixe nas dietas, por razões de sustentabilidade e custo: as fórmulas de alimento para aquicultura mudaram significativamente nos últimos anos, diminuindo a utilização de ingredientes marinhos e aumentando a utilização de ingredientes vegetais. Nestas fórmulas, embora as dietas vegetais possam atingir os níveis de proteínas necessários, as necessidades nutricionais de micronutrientes como DHA/EPA, vitaminas, aminoácidos e nucleotídeos das espécies precisam ser ajustadas para otimizar a nutrição, o crescimento e a sobrevivência.
Para assegurar a rentabilidade na produção animal é necessário que haja um manejo nutricional adequado. A aquicultura pode enfrentar doenças e superar condições de estresse, diminuindo a dependência do uso de antibióticos, com práticas de aquicultura responsáveis, que devem ser adotadas como uma estratégia sempre que se pretenda uma produção sustentável.
É possível melhorar o desempenho da aquicultura utilizando dietas econômicas e funcionais, ajustadas às condições e desafios da produção. Ingredientes funcionais, os nucleotídeos são considerados nutrientes semi-essenciais (Li & Gatlin, 2006) e são utilizados na suplementação das dietas, contribuindo para melhorar o desempenho e a saúde de peixes e camarões (Hossain et al., 2020).
As funções dos nucleotídeos nas dietas de peixes e camarões são estudadas há mais de 25 anos, sendo reconhecidas por seus efeitos no fortalecimento do sistema imune e na proliferação celular, o que é refletido por um aumento na sobrevivência e no crescimento. Os nucleotídeos são uma excelente alternativa para, otimizar dietas que utilizam ingredientes vegetais para compensar o baixo perfil de nucleotídeos nessas matérias primas, buscando mais rentabilidade e sustentabilidade.
Nucleotídeos para nutrição ideal e reforço imunológico
Os nucleotídeos desempenham um conjunto diversificado de funções importantes nas células, como subunidades de ácidos nucleicos, transportando a informação genética. São também as principais fontes de energia nas células, componentes estruturais de muitos cofatores enzimáticos e mensageiros celulares. Os nucleotídeos são os blocos básicos para a síntese de DNA, RNA, ATP e coenzimas-chave envolvidas em processos metabólicos essenciais.
Em condições normais, as bases púricas e pirimidinas associadas aos nucleotídeos são obtidas pela síntese “de novo” (Figura 1) com gasto energético e uso de aminoácidos como glutamina, glicina e aspartato, ou pela via de salvamento (reciclagem) de aminoácidos intermediários, e isto é suficiente para atender às necessidades de indivíduos saudáveis.
Caso haja esgotamento do nucleotídeo sob condições de estresse, doenças, lesões ou durante estágios de rápido crescimento e desenvolvimento que requerem uma rápida proliferação celular, a síntese endógena de novo não é suficiente para atender o requerimento dos animais. Nestas situações, a suplementação de nucleotídeos exógenos (através da dieta) é uma alternativa para compensar a deficiência de nucleotídeos, minimizando assim as perdas no desempenho de crescimento ou sobrevivência nos cultivos. Da mesma forma, recomenda-se o uso de nucleotídeos para reduzir o uso de antibióticos em animais sujeitos a condições de estresse típicas da produção aquícola, como manejo vacinal, exposição a doenças, alterações na qualidade da água e parâmetros ambientais.
Durante períodos de estresse com densidades elevadas, transferência, condição ambiental ou doença, os cultivos aquícolas podem beneficiar-se da suplementação de nucleotídeos na dieta, para compensar a sua deficiência, ou para beneficiar-se de efeitos adicionais de suplementação para apoiar a proliferação e diferenciação celular.
Um dos achados mais notáveis em relação à nutrição de nucleotídeos em animais aquáticos são os efeitos de potencialização do crescimento através do fornecimento de nucleotídeos livres mistos em proporções equilibradas (AMP, GMP, UMP, CMP e IMP) a peixes e camarões. A ingestão de nucleotídeos livres reduz o gasto energético e a degradação de aminoácidos para a síntese “de novo”, o que é apontado nos estudos como a razão para uma melhor eficiência alimentar que economiza energia. A ingestão de nucleotídeos pode também alterar a estrutura do trato gastrointestinal, aumentando a altura das microvilosidades de peixes como salmão, tilápia, e camarão (Figura 2). Esta influência favorece a absorção de nutrientes durante a digestão e melhora a utilização da dieta e o crescimento.
Também foi estabelecido que os nucleotídeos influenciam a atividade da fagocitose de macrófagos, a contagem total de hemácias, bem como a atividade intracelular de super ânion oxidase (SOD) e da lisozima (Tabela 1), que são fundamentais para a primeira barreira de defesa do sistema inato, muito importante para o camarão. Por outro lado, a pesquisa sobre a modulação da imunidade adaptativa por nucleotídeos exógenos mostrou resultados consistentes sobre a atividade linfocitária (Shiau, et al., 2015).
Resumindo, os nucleotídeos melhoram a resistência aos agentes patogênicos, aumentam a tolerância ao estresse, modulam as respostas imunes, aceleram o crescimento dos hepatócitos, melhoram a superfície da mucosa intestinal, melhoram a qualidade de larvas e reprodutores de peixes e camarões, além de serem capazes de aumentar a ingestão de alimentos e, indiretamente, melhoram a qualidade da água (Figura 3).
Qual é a diferença entre o conteúdo total e livre de nucleotídeos?
Ao olhar detalhes como o conteúdo e concentração de opções de nucleotídeos disponíveis no mercado, é importante verificar o grau de pureza e as quantidades de nucleotídeos totais e livres. Sobre estes dois tipos de nucleotídeos, podemos dizer:
Nucleotídeos totais: é o conteúdo total de ácidos nucleicos presentes no produto. São nucleotídeos ligados a ácidos nucleicos que não estão disponíveis para utilização imediata pelo animal.
Nucleotídeos livres: são os nucleotídeos não ligados ao RNA (AMP, GMP, CMP, UMP, IMP). Peixes e camarões utilizam nucleotídeos livres para desempenhar um grande número de funções vitais. Os nucleotídeos livres estão na forma pronta para uso por peixes e camarões.
Esta distinção permite que a dosagem correta dos nucleotídeos seja adicionada à dieta com fontes exógenas e uma comparação da concentração de produto equivalente. Produtos mais concentrados e com um nível de pureza mais elevado estão associados a uma maior quantidade de nucleotídeos totais e a um perfil mais elevado de nucleotídeos livres.
Testes com nucleotídeos
Algumas pesquisas sobre a suplementação de nucleotídeos como nutrientes funcionais em alimentos para aquicultura demonstram de forma consistente os benefícios da sua utilização no manejo da saúde de peixes e camarões (Hossain et al., 2020). Estudos com o produto comercial Rovimax® NX com 40% de nucleotídeos livres determinaram os efeitos positivos da inclusão de nucleotídeos em dietas de aquicultura sobre o desempenho e a resistência a desafios com infecções (Figuras 4 e 5).
Conclusão
Estudos sobre os efeitos da suplementação de nucleotídeos em dietas aquícolas revelam que os nucleotídeos podem exercer uma influência positiva sobre a resistência às doenças, melhorando o funcionamento do sistema imunológico. Da mesma forma, a utilização de nucleotídeos está associada a um menor gasto de energia na síntese “de novo”, possibilitando um melhor desempenho e eficiência alimentar. A utilização de nucleotídeos é recomendada em: dietas funcionais para melhorar a resistência à doença e ao estresse do cultivo, e em formulações com substituição de ingredientes marinhos por vegetais, resultando em melhor sobrevivência, taxas de crescimento e sustentabilidade no cultivo de peixes e camarões.
As referências bibliográficas citadas no artigo estão disponíveis mediante solicitação aos autores.