Sem Nitrogênio não há vida

Por Biólogo Helcias Bernardo de Pádua – Biobac


O nitrogênio é um elemento muito importante em sistemas aquáticos, sendo vital como macronutriente. É a chave para a formação de aminoácidos e consequentemente das proteínas, enzimas e componentes estruturais das paredes celulares. Sem o nitrogênio, não existe vida. Ele se encontra na água sob três formas: gás dissolvido, combinações inorgânicas e orgânicas, sendo fixado na forma molecular pelas bactérias e cianofíceas; todas tendo enorme importância na cinética das águas e do solo.

O ciclo do nitrogênio na água, gera substâncias como amônia orgânica e inorgânica, nitrito, nitrato e o próprio nitrogênio na sua forma mais simples. O correto conhecimento das várias fases do ciclo do nitrogênio e o manejo adequado dos organismos sob cultivo, devem fazer parte da rotina de qualquer produtor, que deve ter em mente que, no meio aquático, inúmeras e complexas ações naturais ocorrem sempre para que exista um sistema em equilíbrio.

O CICLO DO NITROGÊNIO

O ciclo do nitrogênio acontece em três estágios distintos: nitrificação, desnitrificação e amonificação.

NITRIFICAÇÃO

A nitrificação se dá em duas fases: a nitrosação e a nitratação. Ambas ocorrem em pH pouco alcalino e na presença de microorganismos.

A nitrosação, ocorre na presença de bactérias Nitrosomonas. Desta forma, a amônia (NH4+) e o oxigênio (O2) na presença de bactérias (Nitrosomonas), resulta em nitrito (NO2) + hidrogênio (H) + água (H2O).

A nitratação, ocorre na presença das bactérias Nitrobacter. O hidrogênio associado ao nitrito (NO2), dependendo da temperatura e com pH baixo, pode resultar em HNO2 (ácido nitroso) mas, em situação de equilíbrio, o nitrito (NO2) é oxidado, na presença das bactérias (Nitrobacter), resultando nitrato (NO3).

DESNITRIFICAÇÃO

O estágio que ocorre a seguir, no cíclo do nitrogênio, é a desnitrificação, também realizado na presença de bactérias (anaeróbicas ou facultativas), ou seja, ocorrendo tanto em meios com ou sem oxigênio.
A desnitrificaçào como diz o nome é essencialmente o inverso do processo de nitrificaçào, e ocorre em condição exatamente opostas, ou seja

Ao contrário das bactérias fixadoras de nitrogênio molecular, essas bactérias desnitrificantes partem de compostos já nitrogenados como os nitrato, nitritos e orgânicos nitrogenados (uréia, ácido úrico) para extrair o N2 (nitrogênio). São elas por exemplo as Pseudomonas sp. que vivem na camada rente ou primeira do solo (lama) oxidando os compostos orgânicos da seguinte forma: hidrocarbonetos (CH2O) + nitrato (NO3), resultando em dióxido de carbono (CO2) + água (H2O) + nitrogênio elementar (N2) + energia.

AMONIFICAÇÃO

O último (ou o primeiro) processo do ciclo de nitrogênio é a amonificação, onde ocorre a decomposição dos nitrogenados excretados pelos organismos ou de cadáveres (animais/vegetais) transformando-os em amônia ionizada (NH4+). Esse processo ocorre principalmente no substrato e no sedimento dos sistemas aquáticos, na presença de bactérias (Micrococcus sp., Sporosarcina ureia, etc.) e fungos.

Na amonificação, o nitrogênio orgânico (aminoácidos, enzimas, ácidos húmicos, fúlvicos, produtos da decomposição e excreção) origina o NH4+ (nitrogênio inorgânico). Como, da mesma forma, o NO3 (nitrato) origina NH4+.

TOXIDEZ

A amônia orgânica não ionizada (NH3), oriunda da degradação da matéria orgânica, é muito tóxica para organismos aquáticos porém é a forma ideal no processo de oxidação das águas.

Já o nitrito (NO2), é tóxico em altos níveis e carcinogênico, quando faz parte de certos compostos (ação sinérgica – um composto aumentando a ação tóxica do outro).

O nitrato (NH3), é sem dúvida o melhor estado para encontrarmos o nitrogênio, por ser de imediata assimilação pelos organismos, como as algas. A princípio não é tóxico podendo também servir como fonte alternativa de oxigênio e nitrogênio para a vida durante períodos de baixa concentração de O2 (durante a noite, por exemplo).

Sob condições quase anaeróbicas, a forma ionizada da amônia (NH4+), acumula-se rapidamente, quando de um aumento do grau de decomposição da matéria orgânica, combinada com a excreção dos organismos, podendo criar sérios problemas, dificultando a já ineficiente oxidação do nitrito em nitrato.

Deve-se evitar as altas concentrações de amônia total na água (NH4+ + NH3) , pois ocasionam, por exemplo, uma elevação do pH sanguíneo dos organismos. Além disso, problemas respiratórios ocorrem quando a amônia total atinge concentrações de 0,4 a 1,0 mg/l. Sugerie-se que esta concentração esteja abaixo de 0,2 mg/l.

A concentração tolerável de NH4+ (amônia ionizada), para os organismos aquáticos, não deve ultrapassar 0,5 mg/l e a de NH3 (amônia não ionozada), nunca superior a 0,6 mg/l. Peixes medianamente sensíveis começam a morrer quando sujeitos a concentração de 0,4 mg/l de NH3 por um período de 24 horas, em pH neutro e a 30 ºC. Mortandade em massa de organismos aquáticos, especialmente com baixas concentrações de oxigênio dissolvido (OD), ocorrem em águas com NH3 igual ou acima de 1,0 mg/l .

Na oxidação do nitrogênio, o pH considerado aceitável deve estar sempre abaixo de 8 UpH (a taxa de nitrificação se torna mais constante em UpH entre 6.3 – 6.7), com uma margem de 6 até 9 UpH, porém sofrendo inibição a pH menor que 6 UpH e pH maiores de 8,5 UpH.

A amônia ionizada (NH4+) se tornará cada vez mais tóxica quanto mais alto o pH (ver tabela)., sendo ainda pouco ou não volátil, porém menos estável e mais solúvel. Já a amônia não ionizada (NH3), que é a mais tóxica porém, se formando em baixa concentração, em pH mais baixo é facilmente volatizável, porém aumentando sua toxidade a medida que aumenta o pH (alcalino), podendo então tornar-se altamente tóxica. Em águas muito alcalinas e com presença de compostos amoniacais, ocorre a formação de níveis mortais de NH4+, a fração ionizada; como também da amônia NH3, a fração não ionizada.

O NH3 e o NH4+, ambos nitrogênio amônico, estarão em equilíbrio na água, com cerca de 99% na forma (NH4+) em pH neutro, sendo esta forma metabolizada ativamente (nitrificação) e considerada como a fonte mais solúvel de nitrogênio.

TEMPERATURA E LUMINOSIDADE

O aumento da temperatura, também acarreta num poder mais tóxico da amônia, evidenciando ser uma variável de efeito sinérgico, fato que deve ser considerado quando a instalação e manejo se dão em ambientes fechados, tipo estufa, águas aquecidas e/ou nebulizadas. A nitrificação não ocorre em temperaturas abaixo de 5 e acima de 45 ºC, sendo inibida em temperaturas abaixo de 10 e acima de 38 ºC.
Outro fator importante é a luminosidade. A pouca ou elevada iluminação inibe diretamente a nitrificação pelos Nitrosomonas em até 100%, portanto, períodos longos com dias nublados ou muito ensolarados, acarretam uma maior concentração de formas tóxicas de nitrogênio.

Portanto, a nitrificação é um processo que depende de muitas variáveis como o pH, temperatura, oxigênio dissolvido, luminosidade, etc, devendo o produtor aprender a valorizar as mesmas para que tenha certeza que está ocorrendo completamente a oxididação da amônia e não o acúmulo de nitrogenados não favoráveis.