Ao retornar à Hungria, sua terra natal, o Dr. Elek Woynarovich enviou à redação da Panorama da AQÜICULTURA uma correspondência contendo suas impressões sobre a aqüicultura brasileira, após sua recente visita ao país, onde participou do Aquacultura Brasil ’98. Nos últimos 60 anos o “Professor” como é carinhosamente chamado, vem assistindo de perto ao desenvolvimento da piscicultura continental em diversos países, incluindo o Brasil. A seguir, com a permissão do Professor, publicaremos trechos da sua carta.
(…) Como preâmbulo é necessário reconhecer o imenso desenvolvimento da piscicultura no Brasil desde 1981, quando começamos a planificar a piscicultura tradicional no âmbito da CODEVASF no Vale do Rio São Francisco e agora vemos a piscicultura moderna estender-se por quase todo o país.
No Aqüicultura Brasil’98 foi muito forte a presença, quase agressiva, da propaganda de alguns braços da aqüicultura em que eu não estou convencido de sua onipotência, e que poderá induzir a falsas trocas de direcionamentos futuros da atividade, tendendo a reduzir as bonitas multifacetas que a aqüicultura pode oferecer. Dois tipos de criação foram propagadas muito intensamente, a criação intensiva e super-intensiva de tilápia vermelha e de Macrobrachium rosenbergii. E isso é o maior perigo!
A aqüicultura (piscicultura) em água doce precisa desenvolver-se nas múltiplas direções, segundo temperatura, forma de terreno, acessibilidade de água, adubos, tipo de comida utilizada, etc…O mercado necessita também de variedade. Não se pode deixar de cultivar peixes porque possuem espinhas e somente cultivar as espécies que não as têm. O gosto do consumidor pode ser direcionado com uma boa propaganda e com bons preços. No Aqüicultura Brasil’98 muitos peixes nacionais e introduzidos foram totalmente esquecidos ou quase não mencionados. Segundo os presentes, poderíamos esquecer nossos conhecimentos sobre tecnologias tradicionais de piscicultura, concentrando somente as atenções na criação de tilápia vermelha e Macrobrachium.
(…) A indústria de rações apoia essas tendências porque para ela é um bom negócio, porém um grande passo pode ser dado na piscicultura tradicional, extensiva e intensiva, ao serem utilizados grandes terrenos para viveiros, usando-se adubos frescos e criação de animais consorciados (patos, marrecos, frangos, suínos, bovinos, búfalos, etc …). Pode-se utilizar os dejetos agrícolas e agro-industriais.
(…) As algas e outros seres vivos aquáticos, produção natural de um viveiro, servem de comida gratuita da natureza. Tudo isso se perde quando se cria tilápia alimentada com ração. Desta forma, perdemos todos os proveitos do policultivo de peixes, que sinergisticamente ajudam um ao outro na alimentação através da produção de comida natural. A piscicultura brasileira oferece excelentes espécies de peixes para criação com soluções baratas para sua propagação em larga escala.
(…) O biólogo alemão Hans Spemann, laureado com o prêmio Nobel escreveu: “ Um progresso só é considerado progresso, quando ao se olhar para atrás, vê-se que tudo o que foi feito foi bom”. Este pensamento merece atenção. A uniformização da piscicultura nega este pensamento.
(…) Houve uma conferência em que se disse que os adubos orgânicos não trazem nenhum proveito aos viveiros. Segundo o conferencista, adubar com resíduos animais os pequenos viveiros onde se cria tilápia vermelha intensivamente alimentando-as com ração balanceada é muito perigoso. Mas, e os viveiros onde a base da produção não é somente a ração balanceada? O adubo orgânico fresco propicia aos animais um importante meio de produção. O uso do adubo fresco é, sem dúvida, uma necessidade em áreas tropicais que não podem ser substituídos por fertilizantes sintéticos.
(…) Entre os instrumentos exibidos na feira faltou uma rede de plâncton para que se possa verificar a presença diária de algas e pequenos crustáceos nas águas dos viveiros, que são importantes alimentos naturais dos peixes cultivados.
(…) Quem pensa seriamente no desenvolvimento da piscicultura brasileira não pode se conformar com “o rabo orientando o corpo do cão” isto é, com as fábricas de rações direcionando a piscicultura e com os supermercados vendendo somente filés de tilápias. Os brasileiros precisam pensar na alimentação dos povoados e das pequenas cidades brasileiras que nem dispõem de supermercados, mas que precisam dos peixes como saudável fonte de alimentos para a sua população.
(…) Segundo o congresso, a aqüicultura deu imensos passos nesses últimos 15 anos e realmente está sendo desenvolvida uma importante indústria de alimentos mas não concordo com a simplificação da piscicultura. Temos que utilizar as imensas possibilidades que são oferecidas nas diferentes regiões do Brasil.